domingo, 10 de agosto de 2008

O NASCIMENTO E EVOLUÇÃO DAS LOCOMOTIVAS

"A humanidade, marchando incansavelmente na estrada da evolução, cumpriu grandes etapas, que nos permitiram atingir o atual grau de progresso". Foram essas as palavras de George Stephenson durante a inauguração da primeira estrada de ferro do mundo.
O trem que todos os dias vemos ou apenas ouvimos passando raramente são notados e apreciados como merecem. Hoje, trens não passam de meros transportadores de carga para a grande maioria. Os leigos não sabem a enorme evolução que já passaram e passam neste que é o mais eficiente meio de transporte concebido pelo homem.
Ao pegarmos a árvore genealógica de uma locomotiva veremos que os veículos ferroviários e rodoviários tem um ancestral comum: Cabriot, o primeiro veículo a ser tracionado por força não animal. Apresentado originalmente em 1769 pelo seu inventor, o engenheiro militar francês Nicolas-Joseph Cugnot (1725-1804), o carro de três rodas e 2,5 toneladas atingia velocidade de 4km/h tendo que parar de poucos em poucos metros para acumular vapor.
Seguindo os trabalhos de Cugnot, chega a vez do engenheiro inglês Sir Richard Trevithick (1771-1833). Embora sua máquina seja conceitualmente parecida com a de Cugnot, Trevithick obteve maior êxito com um carro mais eficiente (aproveita melhor o vapor), veloz e potente. Se aproveitando da experiência pioneira de Cugnot.
Sua máquina, batizada de London Steam Carriage foi apresentada em 1803, pesava cerca de 1,6 toneladas e alcançava 15km/h. Ao contrario da máquina de Cugnot, a do inglês não existe fotos, desenhos ou descrição de sua aparência, havendo contravensa quanto ao número de rodas, alguns autores afirmam ser três como o Cabriot, outros juram ser quatro.
Em 1803, ano que foi testado pela primeira vez sua máquina, Trevithick cometeu um erro muito grave: efetuou sua experiência nas proximidades de um povoado. O pânico foi geral. As pessoas ficaram apavoradas com aquele "monstro diabólico" que cospe fogo e fumaça e faz um barulho ensurdecedor.
Um ano depois, Trevithick teve uma idéia genial: Adaptar sua máquina aos trilhos dos carrinhos da mina de carvão em que trabalhava e que eram tracionados por força animal. O chão de uma mina é muito acidentado, e os trilhos haviam sido uma grande invenção pois davam estabilidade e velocidade aos carrinhos de rodas de ferro. Se davam certo com aqueles carrinhos, porque não daria certo com sua máquina que era também provida de rodas de ferro e não se davam bem com o pavimento de terra.
Ao contrário da sua primeira máquina, a segunda é bem conhecida pela enorme quantidade de informação e gravuras sobre ela. Esta possuía quatro rodas sendo todas acionadas por um único cilindro através de um engenhoso sistema de engrenagens. Além disso, possuía também uma enorme roda giratória denominada volante de inércia que proporcionaria uniformidade de funcionamento ao motor.
Então chegou a vez de George Stephenson (1781-1848). Este inglês recebeu o título de pai das locomotivas. Inspirado pelos trabalhos de Trevithick, Stephenson acumulou idéias durante décadas e, foi ajudado por seu filho Richard Stephenson (1803-1859) que foi considerado oprimeiro engenheiro ferroviário do mundo.
A consagração dos Stephenson veio em 1829, ano em que a locomotiva batizada de "The Rocket" manteve-se com carga à vertiginosa velocidadede 25km/h em um concurso de inauguração de uma linha entre Liverpool e Manchester. Nesta época, já haviam vários fabricantes de locomotivas e a tração animal já havia perdido terreno para a tração a vapor. As locomotivas evoluíam muito rapidamente.
O The Rocket apresentou características que seriam encontradas em todas as locomotivas a vapor fabricadas e inspiraria todos os tipos de locomotivas que existem e vão existir além dos veículos rodoviários. Se não fosse o The Rocket, essas robustas e valentes diesel-elétricas que vemos por aqui hoje, provavelmente seriam bem diferentes sem contar que o famoso carro de Henry Ford poderia nunca ter existido ou, na melhor das hipóteses, existiria, mas bem diferente. O The Rocket foi umverdadeiro divisor de águas. A pedra fundamental do meio de transporte terrestre.
Nos Estados Unidos, o trem teve um papel fundamental. A famosa marcha para o oeste é nada menos que a construção da estrada de ferro ligando o Oceano Atlântico ao Pacífico.

GRANDES VAPORES AMERICANOS

Os Estados Unidos, com suas dimensões continentais, rico como sempre foi e extremamente organizado (ferrovia demanda organização, coisa que o Brasil menos tem) acabou por se tornar um ninho de locomotivas. A partir da segunda metade do século 19, vários fabricantes americanos duelavam entre si em busca da maior potência, eficiência, poder de tração e velocidade. Entre os fabricantes, os maiores eram ALCo e Baldwin. Sendo o primeiro mais recente, do início de século 20. Vale mencionar que na segunda metade dos anos de 1800, as locomotivas já alcançavam cerca de 100km/h e atingiam potências superiores a 2.000hp.
O design básico de uma locomotiva a vapor, como havia sido mencionado acima, não nega o DNA da pioneira The Rocket. Contava com uma caldeira de forma cilíndrica montada sobre um estrado em que estava preso aos eixos. A cabine se encontrava no extremo posterior da máquina e nela estava a abertura da fornalha. Junto à máquina estava um pequeno vagão chamado de tender que servia de reservatório de combustível (lenha, carvão vegetal ou hulha). O fato de a cabine estar situada na parte traseira da locomotiva é devido justamente ao tender, pois o foguista arremessava o combustível do tender para a fornalha.
A caldeira era do tipo "tubo de fogo". O calor da fornalha segue por tubos até a chaminé da locomotiva localizada no extremo frontal da máquina atravessando toda a extensão da caldeira, esta cheia de água. Na busca de maior potência e eficiência, cerca de 10.000 explosões de caldeira ocorreram em todo período de desenvolvimento das locomotivas a vapor. Obviamente, muitas pessoas morreram neste período.
A transmissão da potência às rodas é realmente o ponto crucial de toda locomotiva, principalmente as a vapor. O tipo mais comum são as locomotivas tipo Rod-steam, em que um cilindro com um pistão de duplo efeito (puxa para os dois lados) aciona diretamente as rodas por meio de braçagens. Não é algo simples, como não existe variação de velocidade (como as marchas em um carro), limitava muito a aplicação das locomotivas principalmente em baixa velocidade, situação na qual a potência é baixa. Esta característica obrigava a se utilizar locomotivas dedicadas para cada aplicação como por exemplo locomotivas de rodas de tração grandes para velozes e leves trens de passageiros e locomotivas de rodas pequenas para pesados trens de carga.
Pensando nisto, um outro tipo de locomotiva a vapor foi desenvolvido, as Geared-steam. Nelas o motor a pistão não acionava diretamente as rodas, mas um conjunto de engrenagens redutoras em que a partir delas, acionavam as rodas. Embora a idéia seja boa, eram máquinas que nunca foram plenamente desenvolvidas devido a problemas de patentes e a maior complexidade e custo de produção. Existiram três tipos básico de locomotivas Geared-Steam: Shay, Climax e Heisler. Todas as três muito diferentes mas com o mesmo conceito.
O estado de arte das tradicionais Rod-steam eram as locomotivas denominadas Mallet (seu inventor, o suíço Anatole Mallet - 1837-1919). Mallets são locomotivas compostas, ou seja, uma locomotiva com dois ou até três arranjos de rodas motrizes. Estas máquinas deram margem à grandes potências e poder de tração e elevaram as locomotivas a vapor ao limite de seu desenvolvimento. Quem já ouviu falar da Big-Boy. Estaque é uma das maiores, mais potentes e pesadas máquinas de todos os tempos é um bom exemplo de mallet. No final dos anos 40 a mais potente locomotiva a vapor era a Allegheny com incríveis 7.500hp. Só por curiosidade, a diesel mais potente não tem mais que 6.000hp.
Falando em potência, a mais potente locomotiva a vapor foi um Duplex não articulado (Mallet é um Duplex articulado, portanto, não Mallet) construído pela Baldwin nos anos 40 denominado Q2 com nada menos que 7.987hp! Se nos anos 40 as locomotivas a vapor atingiram tal potência imagine se fossem fabricadas ainda hoje!

DIESELIZAÇÃO

Em 1892 um francês naturalizado alemão predestinado chamado Rudolf Christian Karl Diesel (1858-1913) apresentou a patente de uma variação do motor de combustão interna do francês Alphonse Beau de Rochas que mudaria a história do transporte ferroviário. O motor apresentava rendimento térmico em média 10% mais alta que o motor do ciclo Otto (4-tempos, gasolina) além de consumir bem menos combustível que no caso era um óleo pesado muito barato na época que viria a se chamar Diesel, devido ao motor. O motor do ciclo Otto não poderia tracionar uma locomotiva pois seu rendimento tende a cair proporcionalmente ao seu tamanho, mas este novo motor era diferente. Sua arquitetura interna permitia sua câmara de combustão ser exageradamente grande sem que seu rendimento seja prejudicado. Era perfeito para aplicações pesadas.
Em 1913, talvez inspirada pelos trabalhos de Jean Jacques Heilmann com seu "Le Fuseé Electrique" nos anos de 1890 ou pela dificuldade de se construir uma transmissão apropriada e ainda entusiasmada com o desempenho da tração elétrica (em voga na época, que veremos mais adiante) no transporte ferroviário, a GE apresentou uma locomotiva elétrica que trazia sua própria fonte geradora, denominada GE 57-ton gas-electric boxcab. Ao invés do motor diesel ela utilizava um motor agasolina convencional pois os motores do ciclo diesel ainda não apresentavam confiabilidade suficiente.
O motor era um 6 cilindros 4-tempos ciclo Otto com 200hp nominal, este acionava um gerador CC que produziria corrente para os motores elétricos montados nos eixos. Apresentava qualidades de uma locomotiva elétrica como potência constante com a possibilidade de trafegar em linhas não eletrificadas. É o ancestral das locomotivas atuais.
Nesta época havia o embate entre as locomotivas a vapor e as moderníssimas para a época locomotivas elétricas. Não foi fácil para nenhuma das duas. As a vapor davam sinais claros de cansaço e as elétricas embora apresentassem um desempenho nitidamente superior que as vaporosas, tinham o problema da sua alimentação que requer o cabo aéreo (catenária) ou o terceiro trilho. Além disso, a energia elétrica deveria ou ser comprada de terceiros, o que não era nada barato ou produzida pela própria empresa ferroviária, além das subestações que deveriam estar entre 10 e 40km uma das outras (no caso das linhas em corrente contínua) ou a 100km (corrente alternada). Realmente as locomotivas elétricas requerem uma incrível infra-estrutura.
O eminente fim de uma e a caríssima infra-estrutura da outra motivou algumas empresas a estudarem uma nova forma de locomotiva. A GE já produzia ótimas locomotivas elétricas e exibiu a pioneira 57-ton mas coube a outra empresa o mérito colocar em funcionamento sério uma nova geração de locomotivas: A EMC (Electro-Motive Company).
Fundada em 1922 nos Estados Unidos, a EMC foi sem dúvida a maior responsável pela dieselização nos anos 40 e 50. Seu fundador, Harold L. Hamilton é considerado o pai da locomotiva diesel. Nos anos 30 agigante GM viu a EMC como uma grande oportunidade para crescer e negociou a sua compra. Em 1941 a EMC que já era a maior fabricante mundial de locomotivas teve seu nome alterado para EMD (Electro-MotiveDivision). Suas locomotivas eram imbatíveis. A perfeita combinação da potência elétrica com a potência mecânica. Para se ter uma idéia do seu brilhantismo técnico, a belíssima EMD SD18 construída nos anos 60 ainda trabalha normalmente em qualquer tipo de trem da MRS Logística, apesar de sua potência ser relativamente baixa, 1.800hp, os maquinistas só tem elogios a fazer sobre ela.
A dieselização que fez emergir algumas empresas como a EMD e a divisão de locomotivas da GE, fez um estrago tremendo naquelas que, na época de ouro das locomotivas a vapor, eram reis: ALCo e Baldwin.
Ambas estavam muito atreladas nas suas raízes e não tinham tecnologia para desenvolver e produzir os componentes fundamentais da nova geração de máquinas: gerador de tração e motores elétricos de tração além do seu sistema de controle. Para sobreviverem, a única coisa a fazer era comprar esses componentes de outras empresas. A ALCo se associou à GE que na época ainda não produzia locomotivas de grande porte e a Baldwin firmou contrato com a Westinghouse Electric Company para fornecer componentes elétricos.
Hoje infelizmente nenhuma das duas e de diversas outras fabricantes detodo o globo existem mais. A GE começou a produzir locomotivas pesadas em grande escala e passou a ser concorrente de sua sócia ALCo, obviamente esta não resistiu e fechou as portas em 1969 depois de maisde 75.000 locomotivas produzidas. A Baldwin durou menos, fechou asportas no remoto ano de 1956, sendo que em 1950 a Westinghouse tinha descontinuado sua produção de equipamentos elétricos e forçou a Baldwin a comprá-los da GE. A Baldwin encerrou operações com 70.500 gloriosas locomotivas produzidas.
A morte de tradicionais fabricantes, embora muito triste, é algo muito comum nesses momentos de mudanças radicais estruturais de um sistema.Algo parecido ocorreu na aviação anos depois, quando os motores a pistão foram preteridos pelos motores turbojato, lendários fabricantes como Napier e Pratt & Whitney sucumbiram. Prosperou a GE, mais uma vez ela, como grande fabricante de turbojatos.
A história se repete, primeiro foi com os fabricantes de locomotivas, pouco depois com fabricantes de motores aeronáuticos. Não me surpreenderia se algo parecido ocorresse com os fabricantes de automóveis. Como sabemos, o petróleo está a quatro, na melhor das hipóteses cinco décadas do seu completo fim. Temos hoje no mundo, centenas de fabricantes de carros e obviamente muitos deles não sobreviverão ao fim da era do ouro negro. Na minha opinião os fabricantes Europeus serão os mais prejudicados por serem os mais conservadores e relutantes a mudanças. Americanos e japoneses já são ávidos a mudanças, basta ver o quanto eles investem em veículos híbridos (que combinam o motor térmico a um motor elétrico de modo a poupar combustível), que são sumariamente ignorados pelos engenheiros Europeus. Mais uma vez, vemos fabricantes profundamente atrelados a conceitos que certamente ficarão obsoletos e que, morrerão abraçados a eles.

O DUELO DAS TRANSMISSÕES

Como visto mais acima, a transmissão da potência é o ponto crucial de uma locomotiva a vapor, mas em uma locomotiva diesel chega a ser mais do que isso. Chega a ser sua parte mais complexa e importante, definindo completamente sua forma e aparência.
Todos já ouvimos falar em "seleção natural", sabemos o que ela significa e como ela rege as leis naturais da evolução. Um computador por exemplo é hoje desse jeito devido a seleção natural que o definiu assim. Até chegar ao ponto em que se encontra, houve um feroz embate de conceitos até atingirmos a sua forma mais equilibrada em todos os sentidos.
Uma locomotiva diesel é fruto de uma seleção natural, vários conceitos foram tentados até chegarmos a estas locomotivas que vemos hoje.
Embora as locomotivas de tração elétricas, denominadas diesel-elétricas dominarem o cenário atual das ferrovias, alguns fabricantes, mais precisamente fabricantes ingleses e alemães, buscaram e buscam uma forma de tração que pudesse ao menos se equiparar às diesel-elétricas.
Alguns podem perguntar: Por que não utilizar a força do motor diesel diretamente nas rodas como nos veículos rodoviários como é nas motocicletas, automóveis, caminhões, tratores, etc?
A resposta é longa, são vários os fatores que contribuem para isso. Primeiramente falaremos de três coisas: potência, peso e velocidade.Um carro é relativamente muito pouco potente, varia de 70hp nos 1.0 atuais até a 1.001hp do recordista Bugatti Veyron, sendo que a média mundial de potência automotiva não é superior a 150hp. Esta potência, para aplicação ferroviária não serve, pois além de baixa, se encontra em um regime de rotação muito alto do motor. Se você quiser utilizar a potência total do motor terá que pisar fundo no acelerador, situação naqual o motor consome muito combustível, faz muito ruído e se desgasta muito rapidamente. Se você utilizar a potência máxima do motor do seu carro constantemente, teria sorte se ele durasse algumas semanas. Um motor ferroviário é projetado para produzir potência máxima de forma constante e mesmo assim pode durar por décadas. Isto devido principalmente à rotação máxima do motor que não é maior do que 1.000 RPM (rotações por minuto). Mas um carro é um veículo muito leve, os populares tem cerca de 1 tonelada e podem transportar uma carga total de 500kg. Uma locomotiva de seis eixos pesa 180 toneladas e pode puxar uma carga de 10.000 toneladas. Como o motor ferroviário gira a máxima de 1.000 RPM e um trem pode atingir velocidades superiores a 100km/h com carga plena, é fácil deduzir a quantidade de "marchas" que uma suposta caixa de engrenagens teria que ter para conseguir este feito.
Não existe veículo mais pesado que um trem. Um caminhão, por mais pesado que seja, não supera 50 toneladas. Só por curiosidade um vagão tipo gôndola, aberto em cima para o transporte de minério por exemplo, pode atingir 100 toneladas e um trem chega a ter centenas deles! Em um caminhão, a caixa de velocidades é manual e a embreagem é por fricção igual a de um carro. Os caminhões mais modernos possuem caixa automática planetária com embreagem por acoplamento viscoso. Independente de ser manual ou automática, obviamente o número demarchas é muito grande, podendo ter mais de vinte. Isto porque os mais potentes caminhões atingem "apenas" 500hp a razoável velocidade de 2.000 RPM. Imagine um trem com suponhamos 9.000 toneladas e uma potência de 4.300hp. Se um caminhãozinho já necessita de uma caixa razoavelmente grande e complexa, como seria a caixa deste trem em questão.
O terceiro fator é a velocidade. Um trator pode ser bem potente e ter muito esforço de tração (torque). Mas é lento, não corre mais que 30km/h. A transmissão do trator é projetada a multiplicar sua força afim de proporcionar grande esforço de tração. Uma locomotiva diesel é naturalmente bem mais potente do que qualquer trator e tem muito mais força em baixa velocidade do que ele mas a ainda conta com um agravante. Além da força em baixa velocidade, deve atingir alta velocidade sem que sua força em baixa seja prejudicada.
Como vemos, um trem leva ao limite esses três fatores: É muito pesado,muito potente e veloz enquanto os veículos rodoviários são apenas uma pequena fração disso. Um carro pode ser muito veloz mas é muito leve enão tem muita potência. Um caminhão, por mais pesado que seja, é muito mais leve do que um trem, bem menos potente mas atinge velocidade próxima a de um trem de carga e um trator pode ter força de tração quase tão alta quanto a força de um trem mas é bem mais leve e muito menos veloz. Estes três fatores juntos e elevados a níveis inacreditavelmente altos, fazem com que a transmissão de uma locomotiva, no caso, uma locomotiva diesel tenha que ser algo realmente especial.
Embora uma caixa de velocidade seja difícil de ser construída para fins ferroviários, não houve falta de tentativas para o feito, principalmente na Inglaterra, onde nasceram. Locomotivas com transmissão por caixa são denominadas diesel-mecânicas. Locomotivas diesel-mecânicas foram estudadas e produzidas tão logo o motor térmico se tornou realidade. Se dava certo com carros por que não daria certo com trens, pensaram os engenheiros. A prática se mostrou cruel com os designados a desenvolvê-la. Como visto acima, a caixa teve que ser grande, realmente muito grande, com centenas de peças móveis sujeitas a quebras que não tardaram a ocorrer. Rapidamente os fabricantes perceberam a impossibilidade utilizar este conceito de transmissão em locomotivas com mais de 1.000hp. Os motores das máquinas foram aos poucos encolhendo de tamanho e potência enquanto aumentavam sua velocidade de funcionamento. Foram ficando parecidos com os motores rodoviários até atingirem um tamanho "seguro". Cerca de 500hp. E as máquinas que os dispunham foram relegadas apenas a serviços leves como manobreiras em pátios e em indústrias além de leves trens de passageiro múltipla-unidade, com pouca exigência mecânica.
A caixa utilizada era sempre do tipo planetária com embreagem por acoplamento viscoso. O tipo mais robusto e durável, mas o alto estresse no qual os materiais são submetidos fazia com que o que era brilhante na tração rodoviária fosse completamente inútil na tração ferroviária. Realmente, uma locomotiva diesel não é apenas um carro grande e pesado, é muito mais do que isso.
Enquanto os britânicos lutavam contra os problemas das diesel-mecânicas, nos Estados Unidos as diesel-elétricas esbanjavam todo seu poderio técnico e brilhavam em todos os sentidos. Realmente tinha sido uma grande tacada dos americanos. Com a transmissão elétrica os motores elétricos e térmicos atuavam na sua forma mais natural, com os diesel trabalhando em velocidade quase constante e o elétrico, responsável pela movimentação da locomotiva com sua característica de potência constante, trabalhando em uma ampla gama de velocidades. Para quem não sabe, os motores a pistão foram concebidos não para acelerar e reduzir velocidade, mas para funcionar em rotação fixa. Devido a isso que todo veículo tracionado por um motor térmico tem a necessidade deu ma caixa de velocidades, pois existe um limite mínimo e máximo de RPM que deve ser respeitado além de sua força e potência não ser contínua como um motor elétrico, mas se encontra em um ponto dentro do seu limite de RPM.
Nos veículos rodoviários, esta limitação técnica inerente a este tipo de motor é camuflado pelo peso do veículo ser em geral muito baixo. Mas em aplicação ferroviária em que se fala em centenas ou milhares de toneladas, limita completamente seu uso. Sendo assim, uma locomotiva diesel-mecânica vai contra as leis que regem o seu funcionamento. Basta dizer isto para vermos que este conceito de tração estava fadado ao fracasso.
Paralelamente, na Alemanha alguns fabricantes de locomotivas como Krupp e Krauss-Maffei além de empresas de tecnologia como Voith e uma divisão da Mercedes-Benz, a Maybach trabalhavam em outro tipo de sistema de transmissão. Assim nasceu a locomotiva diesel-hidráulica.
Em uma locomotiva diesel-hidráulica, o motor diesel aciona diretamente uma bomba centrífuga que, através de um fluído especial, faz girar uma segunda roda denominada turbina, esta que irá acionar as rodas da locomotiva. Não existe contato físico entre as duas, o fluído faz todo o serviço. Este dispositivo é denominado "conversor de torque".
Embora pareça, de simples não tinha nada. A velocidade do trem era limitada pela rotação do motor diesel que nestas locomotivas chega acerca de 1.500 RPM e como sabemos, motores térmicos não são bons em subir e descer de giro como os motores elétricos. A partir desse ponto, vemos mais um feroz embate: O sistema totalmente hidráulico da Voith eo sistema hidromecânico da Maybach, este batizado de Mekhydro.
O sistema da Voith consiste em vários conversores montados em um eixo comum. Conforme a necessidade, algumas janelas são abertas entre um conversor e outro por um mecanismo elétrico e o fluído pressurizado e se movendo com velocidade escapa por essas janelas para o conversor seguinte, este que possui tamanho diferente do primeiro e irá impor mais velocidade ou mais força a locomotiva, dependendo do seu diâmetro.
O sistema Mekhydro já é um velho conhecido, trata-se de uma transmissão mecânica convencional com engrenagens planetárias mas, no lugar da embreagem por acoplamento viscoso, possui um conversor de torque.
Não é difícil saber quem se deu melhor. A Mekhydro é tão vulnerável a quebras quanto as diesel-mecânicas britânicas ao passo que a transmissão Voith, não só destruiu sua concorrente local, como se mostrou apta a enfrentar as diesel-elétricas americanas.
De fato, as locomotivas diesel-hidráulicas demonstraram um apetite voraz inicial. Empresas ferroviárias Européias adquiriram centenas de locomotivas deste tipo, sendo a mais popular a alemã V200 de 2.200hp.
Vale lembrar que o grosso das ferrovias Européias nesta época (anos 60) já estavam eletrificadas, restando poucas linhas principais não eletrificadas e linhas secundárias para a valente V200 enquanto os pesados trens de carga eram tracionados por locomotivas elétricas.
Nos Estados Unidos, várias Krauss-Maffei ML4000 de 4.000hp foram utilizadas, no começo era uma maravilha. Eram menores e bem mais leves, portanto ideais para linhas com restrição de gabarito além de serem mais baratas que uma equivalente diesel-elétrica, mas no decorrer do seu uso a coisa mudou. Simplesmente elas não suportavam o regime de horas e horas de aceleração plena, situação na qual as diesel-elétricas estão em casa.
O fluído do conversor aquecia demais e a máquina perdia força chegando ao ponto da completa imobilização. Mas isso não é tudo, como contavam com dois motores (um para o truque dianteiro e outro para o truque traseiro), sua manutenção era trabalhosa e dispendiosa. O consumo da máquina obviamente não era baixo e o fantasma que assombrava as diesel-mecânicas, mostrava a cara nas diesel-hidráulicas: Para levar o torque do conversor para as rodas, um emaranhado de engrenagens, eixos e juntas universais era requerido e apresentavam desgaste prematuro por estresse. Como se não bastasse, este complexo e pesado sistema roubava grande parte da força chegando ao ponto de os engenheiros americanos duvidarem que a força que chega às rodas seja realmente 4.000hp. As diesel-elétricas de 3.000hp da época davam um banho nela.
Nesta época, a ALCo que dependia da GE para o fornecimento dos componentes elétricos, viu na transmissão Voith a chance de se ver livre da gigante General Electric e em 1964 apresentou a locomotiva DH643. Infelizmente, por fatores citados acima, naufragou.
Em 2006 a alemã Voith apresentou um novo modelo de locomotiva diesel-hidráulica. A Voith Maxima 40 CC equipada com um motor V16 turbodiesel eletrônico com potência de 4.800hp. Mais uma vez em uma tentativa não de enfrentar as diesel-elétricas (atualmente insuperáveis), mas uma opção a elas. Resta saber se vão apresentar os mesmos problemas que suas primas tiveram no passado.
No Brasil, tivemos uma experiência com este tipo de tração. Nos anos 70 a EFVM comprou um lote de 14 Krauss-Maffei ML4000 que na época, eram as mais poderosas locomotivas diesel por aqui. Diz a lenda que sua força na partida era tanta que chegava a fazer covas na linha de tão violenta que era sua patinagem. No início dos anos 80 foram todas baixadas e para seu lugar chegaram as maravilhosas diesel-elétricas EMD DDM45. Um monstro com um motor diesel de 20 cilindros e lindos truques de quatro eixos. Embora menos potentes que as ML4000 (3.600hp), inútil dizer que depois da chegada das DDM45, ninguém sentiu saudades das máquinas da Krauss-Maffei. A história se repete (como mencionado mais acima), por onde passou a ML4000 juntamente com sua transmissão diesel-hidráulica, fracassou.
Talvez seu fracasso se deve a estas máquinas especiais serem utilizadas como uma diesel-elétrica convencional. Se ao invés de pesadíssimos trens de carga fossem utilizadas como máquina de apoio, como por exemplo os "helpers" (em alguns pontos críticos como por exemplo uma forte rampa, acopla-se uma ou mais locomotivas no final do trem para aquele propósito e logo depois de vencido o obstáculo, são desacopladasem movimento mesmo) ou velozes trens de passageiros, poderíamos ainda ter essas bonitas e curiosas máquinas dando o ar de sua graça por aqui. Fomos cruéis com elas. Consta que operadoras nacionais e americanas resolveram aproveitar sua alta potência em trens principais e não quiseram relegá-las a trens secundários. Acontece que na tração ferroviária, nem sempre a mais potente é necessariamente a mais capaz. Tudo depende da forma como essa potência é aplicada.

SUPREMACIA DIESEL-ELÉTRICA

Como visto acima, transmitir a potência de um motor térmico, deficiente e ineficiente por natureza, às rodas de um veículo tão pesado como uma locomotiva não é uma tarefa das mais simples. Que o diga ingleses e alemães.
Locomotivas elétricas existem desde quando o trem foi inventado. Em 1837 o escocês Robert Davidson (1804-1894) construiu uma locomotiva alimentada por células galvânicas (isto mesmo, baterias!) e propelida pela brilhante máquina inventada em 1821 pelo cientista inglês Michael Faraday (1791-1867). Em 1879, o alemão Ernst Werner Von Siemens (1816-1892) apresentou em uma exposição em Berlim uma pequena locomotiva alimentada com corrente contínua a 150V por um trilho central, esta corria a 20km/h puxando três vagões em uma via circular de trezentos metros. Desde então, locomotivas elétricas pipocavam em todo o mundo oferecendo grandes vantagens técnicas à tração a vapor.
Realmente, os responsáveis pelo desenvolvimento de locomotivas viram no motor elétrico a mágica solução de todos os problemas e dificuldades inerentes à tração férrea. Motores elétricos podem partir da imobilidade com carga plena pois produzem força total a zero RPM e sua característica de potência constante conferia a eles a capacidade de atuar em uma vasta gama de velocidades sem a necessidade de uma caixade engrenagens. Ou seja, com a utilização do motor elétrico, elimina-se a interligação entre a fonte do movimento da máquina e as rodas, o centro de todos os problemas das diesel-mecânicas e diesel-hidráulicas. Como visto mais acima, a GE em 1913 já via neste sistema uma possibilidade real sucesso, este que foi alcançado pela EMC pouco tempo depois com a produção em série de 27 automotrizes diesel-elétricas depois de testar sem sucesso um protótipo gás-elétrico.
Este tipo de sistema de tração não era novo. Como mencionado anteriormente, o francês Jean Jacques Heilmann havia apresentado sua patente em 1890 e em 1892 o primeiro protótipo seria construído. Esta máquina, batizada de "Le Fusée Electrique" contava com um motor a vapor que aciona não as rodas ou engrenagens ligadas a elas, mas um gerador CC e que enviará corrente para os motores elétricos de tração montados no próprio eixo das rodas. Importante mencionar que esta máquina possuía dois arranjos de rodas (truques) montados nos extremos da máquina, como são hoje todas as diesel-elétricas. Cada truque tinha quatro eixos com 60hp cada, o que dava um total de 480hp para tração. Uma locomotiva com certeza muito a frente de seu tempo.
Depois da Heilmann, houve outras locomotivas que utilizavam um motor a vapor, que no caso eram turbinas a vapor acionando um gerador elétrico. Estas serão discutidas mais adiante.
Com certeza, uma locomotiva diesel-elétrica tem o melhor dos dois mundos. Apresenta as vantagens de uma locomotiva elétrica como força e potência abundante com a vantagem das locomotivas a vapor de poderem trafegar em qualquer linha, seja ela eletrificada ou não.
Um motor elétrico é uma máquina fascinante. Tem um aproveitamento mecânico superior a 95% enquanto os motores térmicos a pistão mais eficientes de hoje, não superam 30%. Como já falado, possuem força máxima a um mínimo de RPM somado com potência constante em qualquer que seja a faixa de rotação, além disso são extremamente robustos (uma única peça móvel) e praticamente isentos de manutenção, exceto pelas escovas de carvão do comutador (coisa eliminada nas atuais máquinas de tração CA). A transferência de seu torque para as rodas se dá por um pinhão em seu eixo e uma coroa fixada no eixo da própria roda. Existe um motor para cada eixo, portanto, uma locomotiva de seis eixos possui seis motores, uma de quatro eixos possui quatro e assim por diante.
Vale lembrar, que quando falamos em potência constante, estamos nos referindo ao motor elétrico CC tipo série. O mais comum em locomotivas. No motor série, os enrolamentos do campo (estator) e da armadura (rotor) são ligados em série um com o outro, havendo portanto a necessidade de escovas de contato e comutador para transmitir a corrente para a armadura. Nos novos motores de tração de corrente alternada, não existe escova nem comutador. A tração CA será aborda mais a frente.
Tecnicamente, uma diesel-elétrica é uma locomotiva elétrica completa com uma grande usina termoelétrica a bordo, com direito a todo tipo de complexidade envolvido na geração de eletricidade, que no caso, não é pouca. Sua tensão varia de 500 a 1.500 Volts a uma corrente que pode ultrapassar 10.000 Amperes. A corrente varia de modelo para modelo e é determinado principalmente pela potência do motor diesel embora a tensão seja mais ou menos a mesma. É energia para alimentar uma pequena cidade!
Em eletricidade, tensão x corrente = potência em Watts. Ou seja, em uma locomotiva de seis eixos e portanto seis motores elétricos com um total de 3.000hp de tração, sendo que cada motor rende 500hp, a tensão é de mais ou menos 500V com uma corrente de cerca de 750A. 500x750=375.000 (375kw). Transformando em HP (1hp = 746,4w) dá 502,68hp, arredondando 500hp.
Para acionar esta usina, como sabemos um grande motor diesel é requerido. A vantagem de se ter um motor térmico se dá pela praticidade que este proporciona. Basta abastecer e ligar, diferentemente das a vapor que necessitam de toda uma cerimônia como acender a caldeira e aguardar por longos minutos (ou horas) até que haja vapor suficiente para movimentar a máquina. Comparada com uma locomotiva elétrica, sua maior vantagem consiste que estas obviamente só podem rodar em linhas eletrificadas. Além do mais, as máquinas elétricas tem a deficiência do seu baixo peso que, para quem não sabe, locomotivas devem ser obrigatoriamente pesadas para se evitar o excesso de patinagem (locomotivas, ao contrário do que muitos pensam, patinam muito). Já as diesel-elétricas são lastreadas pelo motor diesel e o gerador, que as fazem quase tão pesadas quanto uma Rod-steam. Estas por sua vez, à medida que a água da caldeira ía diminuindo, perdiam peso. Nada que os engenheiros da época não sabiam, mas isto é um fato que podia reduzir a aderência das máquinas em várias importantes libras.
Finalmente os engenheiros podiam utilizar plenamente um prático motor de combustão interna na tração ferroviária. Algo que realmente revolucionou o transporte sobre trilhos pois consumiam um combustível muito barato e abundante na época.
Diesel-elétricas são locomotivas praticamente sem concorrentes e fruto de uma incansável evolução e revolução de conceitos. Nelas, dois tipos de motores que nada tem em comum trabalham juntos, um compensando o outro para alcançarem um patamar técnico incrível. O estado de arte da engenharia elétrica e mecânica.
A seleção natural havia as escolhido.
Como funcionam? Entender plenamente o funcionamento de uma locomotiva diesel-elétrica requer uma certa dose de conhecimento de mecânica e eletrônica. Impossível falar sem utilizar termos técnicos complicados, já que "complexidade" é a palavra de ordem nestas máquinas.
Primeiramente, o maquinista para acelerar uma locomotiva destas, utiliza uma alavanca denominada "alavanca de pontos". É o acelerador da máquina. Não é um sistema analógico como o pedal do acelerador de um carro, mas um sistema de oito posições (portanto 8 pontos) bem definidas, sendo que cada ponto é um grau de aceleração, com o ponto 1 a menor aceleração e o ponto 8 a maior. É como se o ponto 1 fosse um carro andando em marcha lenta e o ponto 8 o acelerador todo pressionado.
Ao partir com uma locomotiva, o maquinista avança os pontos conforme a necessidade do trem em questão. Se o trem for grande e pesado e a locomotiva utilizada não esbanja potência, é provável que o trem comece a andar lá pelo 4º ou até 5º ponto. Após vencida a inércia, dependendo das circunstâncias, talvez seja necessário acelerar a locomotiva até o seu máximo (8º ponto) e manter lá até que o trem atinja a velocidade pretendida e então é reduzido sua aceleração afim de manter a velocidade. Obviamente, tudo depende de fatores como o tamanho e peso do trem, capacidade da locomotiva e condições da linha (subida, descida, curva, túnel, chuva, sujeira na linha, etc). Ao ver um trem partindo, preste atenção no seu som. Ele começa muito forte e alto, gradualmente, conforme ganha velocidade, o som vai ficando mais fraco. Isto porque o maquinista acelerou plenamente a máquina nos primeiros instantes da partida e, algum tempo depois, reduziu a entrega de potência para conter sua velocidade.
Uma locomotiva sem carga, isto é, sem puxar vagões pode mover-se muito facilmente. Realmente, o 1º ponto é suficiente para garantir que ela rompa a inércia e até mesmo suba alguns trechos de rampas com relativa facilidade. Acelerar uma locomotiva sem carga até o 8º ponto seria quase suicídio para nossas linhas de curvas fechadas e sem inclinação para dentro. Consta que uma locomotiva sozinha pode atingir mais de150km/h!
Até a metade dos anos 60, todas as locomotivas eram dotadas de gerador CC, ou seja, a corrente elétrica de saída do gerador é contínua. Apartir desta data, com o advento dos retificadores de diodo de alta potência, o "dínamo" foi preterido pelo alternador. Isto marcou o início de uma nova geração de locomotivas diesel-elétricas. Até então elas estavam limitadas pelo (mais uma vez!) comutador e escovas que faiscavam muito desperdiçando energia e tinham que ser revisados e trocados periodicamente.
O gerador CC tinha ficado obsoleto.
No início, as diesel-elétricas tinham motor diesel de potência limitada e conforme a capacidade destes era aumentada, tornava-se inviável utilizar uma máquina CC com saída elétrica por atrito para converter toda a potência mecânica de um enorme diesel em potência elétrica. O limite seguro para isto é 2.000hp embora tenha havido locomotivas com cerca de 2.500hp equipadas com o dínamo. Um exemplo é a GE U23C com 2.250hp de tração.
O gerador CC apresentava um modo simples e descomplicado de acionamento das locomotivas. Como os motores elétricos de tração eram CC série (como são ainda hoje na maioria das locomotivas) e o gerador também CC, basta interligar diretamente eles e para variar a velocidade do trem, bastava aumentar a tensão aumentando o RPM do motor diesel. Nada poderia ser mais fácil.
Nas atuais máquinas com alternador e motor de tração CC série, a coisa se complica um pouco. O alternador, ao ser acelerado pelo motor diesel aumenta a sua tensão de saída, até aí tudo bem, só que os motores de tração funcionam apenas com CC, e não com CA. Aí que entra os retificadores. Eles transformam uma onda CA em uma linha CC e problema terminado!
A partir disto, a locomotiva funciona normalmente como uma locomotiva CC comum, só que com a vantagem de se ter um eficiente alternador transformando brilhantemente toda a potência do motor diesel em potência elétrica. O alternador deu vida nova às diesel-elétricas. Embora seja eletricamente mais complexo, não possui o já tão mencionado comutador e escovas de carvão que além de limitar a capacidade das máquinas, mais cedo ou mais tarde, dá manutenção ao passo que no alternador não existe contato físico entre as partes rotativas. Tudo se dá pela indução eletromagnética.
Atualmente vemos a implantação de moderníssimas locomotivas com tração CA, ou seja, além do alternador, elas utilizam motores elétricos de tração em corrente alternada. Mais uma vez, vemos uma grande evolução nas locomotivas. Tão grande como foi algumas décadas atrás com o advento do alternador.
Antes de falarmos deste grande passo que as locomotivas deram, veremos um pouco o que é corrente alternada e corrente contínua. Corrente alternada é denominada assim porque oscila entre carga positiva e negativa várias vezes por segundo determinado pela velocidade do rotor da máquina que o está produzindo (alternador). Esta freqüência édenominada Hertz. Exemplo: 60Hz significa que a corrente oscila 60 vezes por segundo. Portanto, um fio em que passa corrente alternada não é nem positivo nem negativo, são os dois! Já corrente contínua é aquela que possui dois fios: um positivo e um negativo. Não oscila, é constante, portanto, contínuo. CC são encontradas em pilhas e baterias e CA é aquela que temos nas tomadas de nossas casas.
Embora seja muito importante saber, este é um assunto muito complicado e complexo. Como foi falado anteriormente, é impossível explicar o funcionamento de uma locomotiva diesel-elétrica sem que haja uma grande dose de complexidade. O que faz com que sua literatura seja fascinante!
O tipo de corrente determida a forma de funcionamento e as características de um motor elétrico.
O motor em questão é do tipo "CA de indução trifásico". Patenteado em 1888 pelo croata Nikola Tesla (1856-1953), este é um dos mais simples e robustos motores elétricos que existe. Consta de um estator dividido em três fases (trifásico) independentes entre si que são dispostos a 120º um do outro. Cada fase possui várias bobinas e o seu rotor é composto por um conjunto de barras curto-circuitadas por anéis. Não há contato do rotor com outras partes do motor. Sendo assim, é completamente livre de desgaste e praticamente não dá manutenção.
O problema do motor CA está no seu controle. Enquanto um motor CC controla-se apenas variando sua tensão, em um motor CA, além da tensão, devemos controlar a freqüência de sua corrente de entrada. Ou seja, é preciso aplicar uma tensão combinada com a freqüência requerida. Não é uma tarefa das mais simples e exige muita eletrônica embarcada.
Isto porque a velocidade de giro de um motor CA de indução é determinada pela freqüência da corrente (Hertz) mas seu torque é definido pela tensão da corrente. Sendo assim, pode-se aumentar seu torque sem aumentar sua velocidade ou vice-versa. Isso que faz o motor CA ser tão complexo para se controlar mas ao mesmo tempo, tão especial para a tração ferroviária.
Como mencionado mais acima, não importa a potência, mas como essa potência é aplicada. Com o motor de tração CA, nunca a potência de uma locomotiva foi tão bem aproveitada como agora!
Admite-se que uma locomotiva com motor de tração em corrente alternada tenha cerca de 50% mais esforço de tração que uma com motor de tração em corrente contínua de mesma potência. A algum tempo, lí uma reportagem que me chamou muita atenção. Uma ferrovia americana, fascinada com as novas máquinas de tração CA. Mais precisamente a GE AC4400CW de 4.400hp utilizou três destas máquinas no lugar de cinco locomotivas GE C44-9W (de mesma potência mas com tração CC) para tracionar o mesmo trem, que no caso eram 70 vagões de carvão no mesmo trecho da linha, esta que tinha uma rampa muito forte. Ao começar a subir, rapidamente o maquinista jogou o 8º ponto (ligadas em unidade múltipla, ligadas por um cabo com uma comandando as outras, muito comum em locomotivas diesel diversas desde que foram inventadas e que era um sonho antigo dos fabricantes de máquinas a vapor) e mesmo assim avelocidade caiu de iniciais 45km/h para inacreditáveis 0,5km/h (no 8ºponto!) e se manteve assim por mais de dez minutos. Conforme a rampa ía diminuindo, a velocidade ía aumentando. Os computadores das máquinas registraram naqueles instantes 198.000 libras de esforço contínuo de tração para espanto de todos, pois essas máquinas foram projetadas para produzirem um máximo de 145.000 libras. Segundo relatos, se fossem máquinas com tração CC, todos os motores de todas as locomotivas teriam queimados em dois minutos. É como se algo sobrenatural tivesse acontecido. De onde as três AC4400CW tiraram aquela força descomunal!?
Há poucos anos atrás, vimos o advento de locomotivas diesel-elétricas de superpotências. A GE AC6000CW e a EMD SD90MAC-H, ambas com 6.000hp. São máquinas que não deixam de ser interessantes. Combinam um motor diesel de última geração, todo controlado por computador com a formidável tração CA.
Estas máquinas foram projetadas para explorar todo o potencial dos motores de tração em corrente alternada, mas o que vimos foram dois fiascos.
A máquina da EMD inaugurava uma nova geração de motores diesel. O 16V265H-Engine. Uma obra de arte da engenharia que acabou por não vingar. Problemas técnicos diversos e até banais como por exemplo uma fadiga na ligação do pistão à biela que nunca foi resolvido pelos engenheiros puseram fim neste que marcava a chegada do ciclo diesel 4-tempos à EMD. Pouco tempo depois do seu lançamento a empresa o trocava pelo tradicional 16-710G3C e as máquinas foram renomeadas para SD90/43MAC devido a sua potência de tração ser igual a 4.300hp.
O da GE foi parecido. Seu motor era a evolução do confiável e durável 7FDL-16. A fera batizada de 7HDL-16 apresentou desgaste prematuro de suas partes móveis além de problemas como emissão excessiva de fumaça preta, que o reprovou em teste de poluição.
Era o fim das máquinas de 6.000hp.
Como vemos, os engenheiros encontraram dificuldades em produzir um motor diesel com tal potência que seja durável o suficiente para encarar o severo trabalho no qual uma locomotiva é submetida. É como se o motor diesel tivesse chegado ao seu limite. Qualquer coisa acima disto representaria um enorme risco.
O que antes limitava a potência das locomotivas diesel-elétricas, como vimos era o arcaico gerador CC. Hoje estas locomotivas são limitadas pelo próprio motor diesel. A coisa se inverteu. Temos máquinas com componentes elétricos muito aquém de suas capacidades e componentes mecânicos de debatendo além das suas. A partir de agora, se um fabricante estiver disposto a desenvolver uma locomotiva com 6.000hp ou mais, terá que lutar mais uma vez contra limitações técnicas inerentes a um conceito no seu limite. Ou desenvolver uma outra fonte de potência.
A mais potente diesel-elétrica que já existiu foi a EMD DDA40X, da década de 70. Trata-se de um monstro com 30 metros de comprimento, 250 toneladas e nada menos que 6.600hp de tração. Mas não se engane. Esta potência é provida de dois motores 16-645E3 com 3.500hp brutos cada. Cada motor aciona seu próprio alternador e lança potência para seus oito motores de tração. Além dela, a GE U50B de 5.000hp e a ALCo C-855 com 5.500hp foram apresentadas na mesma época e possuem o mesmo conceito. Dois motores diesel com seus respectivos alternadores e oito motores elétricos de tração. Uma época memorável com certeza.
Mais recentemente, a EMD apresentou a SD80MAC. Esta sim, a mais potente diesel-elétrica equipada com apenas um motor diesel. E que motor. Denominado 20-710G3B, uma besta de 20 cilindros e nada menos que 5.250hp brutos para uma potência de tração de incríveis 5.000hp.
Hoje, porém, nem tudo está perdido, a GE lançou uma nova linha de motores, denominado GEVO 12 de 4.400hp para suas mais recentes locomotivas. As ES44AC e ES44DC. Trata-se de um motor que com 12 cilindros que rende a mesma potência líquida dos 7FDL-16, com 16 cilindros. É realmente um feito. Segundo algumas notícias, em pouco tempo a GE apresentará o GEVO 16. Sua versão de 16 cilindros e, provavelmente, 6.000hp novamente. Se isto se confirmar será um feito incrível da engenharia.
A EMD também nos traz boas notícias. Ela estaria testando uma nova geração do 265H-Engine. Mas desta vez não o de 16 cilindros e sim a versão de 12 cilindros do mesmo motor. Durante a curta vida da SD90MAC-H, a EMD chegou a produzir alguns protótipos de uma locomotiva batizada de SD89MAC-H. Simplesmente a mesma máquina mas ao invés do 16V265H-Engine, esta tinha uma versão de 12 cilindros deste mesmo motor. Era o 12V265H-Engine e possuía uma potência bruta de 4.750hp para uma potência líquida de 4.500hp.
Há notícias de que em algum tempo uma versão da ótima SD70 seja equipada com este novo 265H-Engine. Esta máquina se chamaria SD70MAC-H e teria 4.500hp para tração, pondo fim pouco a pouco no brilhante 710, que já mostra algum cansaço. Vamos aguardar.
Neste momento falamos de "potência bruta" e "potência líquida". O que venha a ser isto? Potência bruta é a potência disponível no eixo do motor diesel e potência líquida é a potência para tração, ou seja, a potência disponível nos próprios motores de tração. Como sabemos, potência é uma grandeza que não pode ser criada, apenas transformada. Em uma diesel-elétrica a potência mecânica do motor diesel é transformada em potência elétrica pelo alternador e novamente transformada em potência mecânica pelos motores de tração. Toda transformação possui perdas, sejam elas mecânicas como por atrito ou elétricas como o grau de rendimento do alternador e motores de tração representada pela letra "n" inerente a todas as máquinas elétricas rotativas.
Admite-se que uma locomotiva atual tenha uma perda de rendimento entre 5% e 12% na transmissão sendo que as com motores de tração CA possuem as menores perdas. Vale ainda mencionar que alternadores grandes possuem rendimento mais elevado que os menores, então temos locomotivas de potência elevada com alternadores de maior rendimento devido a esta característica. Por aqui as EMD SD40-2 e as GE C30-7, ambas máquinas com 3.000hp de tração sendo que seu motor diesel gera 3.300hp. Ou seja, 10% de perda. Sempre lembrando que a potência que realmente importa é a potência líquida, pois é ela que vai propelir o trem.
Obviamente, não podemos medir a potência de uma locomotiva como medimos a potência de carros. Tudo é avaliado por computador através de referências e cálculos feitos no ato do desenvolvimento de uma nova máquina.
Enquanto em uma diesel-elétrica as perdas de rendimento varia entre 5%e 12%, em um automóvel de transmissão manual (a mais eficiente), as perdas vão além de 20%. Ou seja, a potência disponível nas rodas é em média 20% mais baixa que a potência no volante do motor. Quanto maior emais complexa for seu sistema de transmissão, como por exemplo em carros 4X4, maiores serão suas perdas. Isso mostra mais uma vez o quanto nossos carros são ineficientes. Verdadeiras máquinas de se desperdiçar energia e nós, mesmo assim, burramente as adoramos.

O SONHO DAS TURBINAS

Quando em 1626 um físico italiano chamado Giovanni Branca (1571-1645), ao aquecer água no interior de um busto metálico e ao dirigir o vapor que saía velozmente por um orifíco na boca da peça fazendo com que um catavento girasse em alta velocidade, tinha sem querer, construído a precursora das turbinas atuais. Desde então, o que era mera curiosidadede laboratrório passou a abrir novos horizontes na mente de engenheiros e físicos da época.
Se Branca com seu "fantoche bufante" nunca tivesse existido, talvez jamais teríamos chegados às turbinas como são hoje.
Com certeza, a palavra turbina mexe com a imaginação popular. Desde os carros "turbinados" até o turbojato dos modernos fighters passando pelas turbinas as vapor e a gás (combustão interna) de centenas de megawatts (MW) de potência utilizadas nas usinas termo-elétricas e termo-nucleares, sem mencionar as turbinas hidráulicas das gigantescas usinas hidro-elétricas. Sem dúvida, a palavra "turbina" causa uma certa dramaticidade onde quer que esteja.
Quando as primeiras máquinas a vapor, com seu motor a pistão baseadas nos estudos de Thomas Savery, Thomas Newcomen, James Watt e William Murdoch, já estavam em um bom estado de evolução, as máquinas famosas por converterem a energia cinética de um fluído em energia mecânica ainda apresentavam um desempenho modesto até que um inglês conhecido por Sir Charles Algernon Parsons (1854-1931) apresentou em 1884 uma turbina que acionava um dínamo para produção de 7,5kw. A partir dela, seu desevolvimento não parou mais e Parsons passou a ser considerado o pai das modernas turbinas. A partir deste ponto, essas máquinas fabulosas passaram por uma espantosa e violenta evolução.
Tão espantosa e violenta que a máquina mais poderosa já imaginada pelo homem é a turbina a vapor.
Como de se esperar, não tardou a aparecer os primeiros experimentos de locomotivas a turbina.
O primeiro estudo de tração por turbina é obra do italiano Giuseppe Belluzzo em 1907. Sua pequena locomotiva de dois eixos contava com uma turbina para cada um deles e seu torque chegava às rodas por meio de engrenagens de redução já que as turbinas giravam à 2.400 RPM. A alimentação das turbinas era por meio de um regulador tipo volante comum, utilizado nas "steam" convencionais.
Mais tarde, em 1931, Belluzzo apresentou outro protótipo. Esta bem maior e mais pesada contando com seis eixos, sendo quatro motrizes.
Além das máquinas italianas, vários outros países estudaram a tração férrea por turbinas a vapor. No início era utilizado a transmissão "direct drive", ou seja, a potência no eixo da turbina era enviada diretamente às rodas através de redução simples. Seguindo o desenvolvimento da tração elétrica e inspirada pelas máquinas da GE e da então EMC, outros fabricantes utilizaram a turbina não para acionar as rodas diretamente, mas para moverem um gerador em velocidade constante e, a corrente produzida seria então enviada a motores elétricos montados junto aos eixos motrizes.
O princípio de funcionamento de uma turbina a vapor é muito simples. Consta de uma carcaça que possui em seu interior uma roda munida de pás ou aletas guia. O vapor produzido pela caldeira é enviado em alta pressão, velocidade e temperatura por tubos até o interior da máquina. Nela o vapor não terá por onde escapar a não ser por uma zona de baixa pressão localizada atrás das palhetas do rotor, portanto, ao se mover em direção à saída, o vapor terá que atravessar as lâminas do rotor em altíssima velocidade, que por sua vez fará este girar produzindo assim potência mecânica.
Turbinas são máquinas que atingem velocidades de rotação (RPM) muito elevadas pois só assim conseguem atingir um bom nível de rendimento. Potência é a velocidade vezes a força (P=V.F), como sua força (torque) não é alta, sua potência depende diretamente de sua velocidade e isto implica em problemas para tração pois requer um conjunto de engrenagens de redução afim de manter a rotação de seu eixo um patamar de potência elevada.
Como sabemos, turbinas não gostam de subirem e descerem de giro, por isso a transmissão direta não é a solução mais apropriada porém, algumas máquinas alcançaram relativo êxito com a transmissão direta. Entre elas mencionaremos a Baldwin S2 Turbine, testada pela Pennsylvania Railroad (PRR) em 1944. Uma máquina bestial.
Construída pela Baldwin com turbina fornecida pela Westinghouse, este colosso de 6.900hp apresentava um design muito parecido com uma locomotiva convencional Rod-steam, com a caldeira cilíndrica e a cabine montada na parte posterior além de truques guia (afrente) e truques reboque (atrás). Possuía uma turbina que acionava dois eixos no centro e transmitia a força para para outros dois eixos através de braçagens no arranjo 6-8-6 pela classificação White. Isto é, um truque guia de seis rodas, um truque de tração de oito rodas e um truque reboque de seis rodas. Como turbinas não podem inverter sua rotação, havia a necessidade de uma outra turbina, esta de menor potência para dar marcha à ré.
Embora tenha sido construído um único exemplar, sua fama se alastrou principalmente por ser, além de uma turbinada, a locomotiva a vapor single-rod, isto é, não composto mais potente já construído. Infelizmente problemas como peso excessivo (não diretamente o peso, mas sua distribuição), pouca potência em baixas e médias velocidades (sabemos porque) e principalmente, custo de produção inacreditavelmente alto impediram seu sucesso.
Além dela e das máquinas italianas, outros países se aventuraram com a tração via turbinas a vapor de acionamento direto, embora funcionassem a contento, nenhuma com rendimento que compensasse o alto investimento que requeria sua produção.
Este foi com certeza o primeiro fiasco que o mundo ferroviário viu. Mas nem tudo estava perdido.
Com o a transmissão da potência da turbina diretamente às rodas se mostrava não inviável mas sim complicado e dispendioso por características de funcionamento da própria turbina, a solução era utilizar a transmissão em voga na época (em voga ainda hoje e talvez para sempre). A transmissão elétrica.
Embora muito mais caro e complicado, pois incorpora novas peças como gerador, motores elétricos, sistema de excitação, governador para a turbina, regulador de tensão, etc. Engenheiros e fabricantes não exitaram em estudar e desenvolver está máquinas incríveis. Embora não conseguissem o êxito que tanto almejavam, abriram novas portas para a tração férrea além de muitas de sua soluções servirem de base para as máquinas que temos hoje e que surgirão no futuro.
Mais uma vez, vemos máquinas muito afrente de seu tempo.
Os primeiros estudos de turbinas a vapor somado à tração por motor elétrico data de 1910 com uma locomotiva experimental inglesa denominada Reid-Ramsey Turbine-Electric. A máquina de 132 toneladas utilizava uma turbina girando à 3.000 RPM acoplada a um gerador CC que enviara uma corrente entre 200 e 600V a seus quatro motores de tração. Estes montados diretamente no eixo das rodas como na máquina de Jean Jacques Heilmann. Sua potência era de 275HP e possuia um total de oito eixos, sendo quatro motorizados e os demais apenas para distribuição de peso.
Em 1922 uma outra locomotiva "steam-turbine-electic" era testada. Conhecida como Armstrong-Whitworth Turbine-Electric. Esta máquina, como o modelo de 1910 também inglesa, deu forma a um conceito que iríamos ver em modelos de décadas seguintes.
Consta de dois carros permanentemente acoplados sendo na parte frontal encontrava-se a caldeira e a fornalha e a parte posterior a turbina e o gerador, possuindo cada carro quatro eixos, sendo três motrizes acionados por um único motor em cada carro através de braçagens, portanto, dois motores elétricos de tração. Vale mencionar que eram CA trifásico assim como seu gerador. Seu peso excedia 156 toneladas para uma potência que chegava a 1.000hp.
Ambos modelos tinham desempenho pífio. Baixa força de tração, alto consumo de combustível além de incontáveis problemas mecânicos e elétricos, mas não foram em vão.
Em 1947, a tecnologia das diesel-elétricas já aflorava, uma nova forma de se fazer locomotivas indicava o caminho que o desenvolvimento iria progredir e o fim das vaporosas era eminente. Como sabemos, a partir desta época, novos fabricantes surgiram e outros mais tradicionais mas sem a tecnologia para acompanhar seu desenvolvimento mostravam uma grande vontade de superação. Estamos falando da Baldwin no ato de desenvovimento de sua inacreditável M1 Turbine construída para a operadora Chesapeake & Ohio (C&O). Um monstro sem precedentes.
Como já mencionado, as duas primeiras locomotivas deste tipo não foram em vão pois sem elas, nunca o mundo teria conhecido esta besta metálica.
Talvez inspirada pela Armstrong-Whitworth, a M1 Turbine constava de dois carros permanentemente acoplados por articulação, sendo a caldeira tradicional por tubo de fogo juntamente com sua fornalha situados no carro traseiro. A turbina, o gerador e a cabine do operador encontravam-se no carro dianteiro assim como um grande reservatório de carvão, este localizado nas laterais da carenagem da máquina.
Com componentes elétricos mais a turbina e todo o aparato técnico formecidos pela Westinghouse, esta máquina produzia 6.000hp (!) transmitidos à linha por nada menos que oito motores de tração sendo que a máquina tinha um total de quatorze eixos devido a seu monumental peso de 400 toneladas. Simplesmente a mais pesada locomotiva a vapor de todos os tempos!
Entre 1947 e 1948, três M1 Turbine foram construídas mas, embora tenham atingido um nível técnico inicial competitivo, com o tempo, entretanto,os problemas foram aparecendo. Entre eles, o pó de carvão que caía e contaminava seus motores de tração além de problemas de curto-circuito provocado por infiltração de água em seus componentes elétricos.
Embora os problemas fossem todos solúveis, eram muito caros de se manter e em 1950, todas foram baixadas. Para nosso desespero.
Hoje, tudo que temos delas (e de muitas outras) são fotos e gravuras além de algumas poucas informações.
Vale ainda mencionar que a parceria entre a Baldwin e a Westinghouse se iniciou com esta máquina e pouco depois do fim da M1, elas passaram a se aventurar com as locomotivas diesel-elétricas. Difícil saber o que teria ocorrido se a M1 Turbine não padecesse de todos esses problemas pois, embora o diesel ser muito barato na época, o carvão era extremamente fácil de ser conseguido devido sua abundância (abundância que persiste maravilhosamente ainda nos dias de hoje). Além disso, a potência e poder de tração das diesel naquela época eram incomparáveis com a da M1 Turbine.
Em 1954, um consórcio formado por Baldwin, Babcock & Wilcox (fabricante de caldeiras) e GE, resultaram em mais uma inacreditável e poderosa locomotiva. Era o canto do cisne das máquinas a vapor.
Construída para a Norfolk & Western, a máquina batizada de Jawn Henry era conceitualmente parecida com a M1 Turbine, embora seja menor, mais leve e menos potente, 4.500hp distribuídos por doze (!) motores de tração montados em quatro truques de três eixos. Era praticamente a evolução da M1.
Com apenas uma única unidade construída de numeração 2300, esta foi a locomotiva a vapor com maior esforço contínuo de tração que já existiu, nada menos que 180.000 libras! Embora apresentasse maior confiabilidade que a máquina da Chesapeake & Ohio, apresentou os mesmos problemas que ela e em 1958 foi baixada. Finalmente a era a vapor tinha chegado ao seu final. Final não melancólico mas glorioso devido a essas (além das tradicionais Rod) máquinas que marcaram a última geração de "steams". Máquinas que funcionavam como por mágica pois apesar da sua enorme complexidade, trabalhavam maravilhosamente sem a intervenção de um único microchip sequer. Máquinas que apesar de não existirem mais, ainda vivem em nossa imaginação. Imagine uma destas nos dias de hoje, arrancando furiosamente com kilometros de vagões ao som arrepiante de sua turbina e fazendo o chão em volta tremer com sua vibração! E em pensar que hoje nos contentamos em ver o "showzinho" que uma SD40 ou C36 dá.
Paralelamente, à turbina a vapor, um outro tipo promissor de turbina estava sendo desenvolvido. Trata-se da turbina de combustão interna ou turbina a gás. Embora no começo de seus dias, confundem-se com a turbina a vapor, é erroneamente considerada a "evolução" das máquinas de combustão externa e seu princípio de funcionamento é mais complexo porém mais versátil e fisicamente menor e mais leve para o mesmo poder de saída mas é também mais limitada em termos de potência absoluta. Pois a potência produzida é proporcional à temperatura atingida no seu interior, fazendo com que cause fadiga ou ruptura das paletas obrigando a se empregar materiais especiais e caríssimos na sua fabricação, como por exemplo a liga de titânio.
A primeira turbina a gás que se tem registro, data de 1872, desenvolvido pelo Dr. Stolze. Em 1903, um norueguês chamado Jens William Egidius Elling (1862-1949) deu forma ao projeto e construiu a primeira turbina a gás com real sucesso: 11hp. Sendo ele considerado o pai da turbina a gás.
O princípio de funcionamento desta máquina é descrito como ciclo Brayton (seu idealizador, o americano George Brayton - 1830-1892). Consta de um rotor munido de várias fileiras de pás. Este rotor gira em alta velocidade aspirando grande quantidade de ar que é direcionado a uma câmara denominada câmara de combustão. Lá, no ar em grande volume e pressão é acrescido o elemento combustível que é incendiado por uma centelha elétrica. Esta que faísca só no momento da partida, não sendo necessário mantê-la em funcionamento pois a combustão se dá expontaneamente após seu início. Após a combustão o gás se expande de forma violenta e então escapa por um duto até as lâminas de um segundo rotor, ligado ao primeiro por um eixo. Este gira devido a força do gás em ignição (por isso, turbina a gás) da mesma forma que uma turbina a vapor e produz assim potência mecânica.
Lembremos que a necessidade do segundo rotor (turbina) é apenas para acionar o primeiro (compressor). Como este "rouba" grande quantidade de potência não é adequado utilizar o eixo da turbina para produzir trabalho.
Vendo isto, grande desafio dos engenheiros era construir uma turbina que a força utilizada para aspirar o ar fosse menor que a força para acioná-la, portanto, não é difícil saber que várias máquinas deste tipo, projetadas para renderem, digamos 100hp, não passaram de meros 10hp.
Era quase um paradoxo. Para se obter grande potência, era necessário uma grande turbina e para se alimentar esta turbina era necessário um grande compressor que irá roubar muita potência, sendo assim, o rendimento de uma turbina a gás era determinado apenas pela "sobra". O que as faziam máquinas muito pouco eficientes.
Pensando nisto, os engenheiros resolveram montar atrás do segundo rotor(turbina) um outro rotor que será acionado pelos gases resultantes e como este "terceiro" rotor não é ligado ao eixo, será livre do peso do compressor e poderá assim girar livremente produzindo grande potência mecânica útil.
Consta que a potência deste rotor é menor do que a potência do segundo devido ao gás que já se encontra levemente mais frio e lento pois começa a entrar em um estado de "saturação", mas sem ele seria inviável utilizar uma turbina de forma plena e a contento.
Este tipo de turbina é chamado de "turboshaft" e é utilizado hoje em motores de grandes aviões comerciais turbo-fan, aviões turbo-hélice, helicópteros e no tanque M1 Abrams por exemplo, além de terem sido empregados em locomotivas como veremos a seguir.
Motores denominados turbojatos, dispensam este artifício pois os gases em alta velocidade resultantes do escape (aqueles que acionam o terceiro rotor nos turboshaft) produzem força de empuxo e propele a máquina para frente. É assim que funcionam os fighters (ou caças, mas prefiro dizer fighters).
Realmente, os anos de 1950 e 1960 foram os anos das turbinas. Nesta época eles começavam a substituir os motores a pistão nos aviões e todos viam nestas máquinas a possibilidade de substituir os motores convencionais até nos automóveis. Em 1963 a Chrysler apresentou um protótipo denominado simplesmente Turbine. Equipado com um turboshaft de 130hp e com um binário de massivos 58,0kgfm em stall, se mostrou viável tecnicamente mas devido ao alto custo de produção, naufragou.
O romance das turbinas a gás com locomotivas data de 1920 e como de costume, com a tração elétrica (turbina acionando um gerador) e a tração mecância (turbina acionando uma caixa de velocidades).
Obviamente a tração elétrica é superior por motivos já vistos, mas como não poderia deixar de ser, não faltaram tentativas de se conseguir uma "gas turbine-mechanical" de desempenho aceitável.
Este tipo de locomotiva é basicamente uma diesel-mecâncica convencional mas com uma turbina no lugar do motor a pistão acionando uma caixa planetária convencional. Vale lembrar que nos primeiros modelos utilizavam embreagem por sistema de acoplamento viscoso normal, como nas máquinas diesel e posteriormente este disposistivo foi abolido pois a turbina de potência (terceiro rotor) age exatamente como um conversor de torque, enviando potência de forma gradual e conforme a necessidade. Isto foi decisivo para aumentar a eficiência destas máquinas e garantir a sobrevida destas pois elimina-se assim um dispositivo responsável por roubar bons HPs além de apresentar problemas como superaquecimento e desgaste.
Em 1959 a British Rail apresentou um protótipo denominado GT3. Constava de um turboshaft de 2.750hp somada a uma caixa planetária que envia força à três eixos de tração através de braçagens. Consumindo diesel e pesando 82 toneladas, esta foi a última e uma das mais famosas locomotivas a turbina de acionamento direto já construído e que como sabemos, não foi adiante embora tenha sido testada sistematicamente nos anos de 1960. Pois além dos problemas e limitações das máquinas com transmissão mecânica, a turbina era também limitada como, por exemplo, pela baixa potência em baixas rotações. Fato que acabava por exigir mais da caixa de engrenagens que por sua vez, se desgastava e quebrava com mais freqüencia que nas locomotivas equipadas com motor a pistão. Pena.
Mas este foi um projeto mais acadêmico. Os engenheiros, já tinham em mente que este tipo de tração somado com este propulsor não poderia mesmo ir muito adiante. Mas, como sempre, foi uma passagem muito interessante da história das locomotivas. Uma página que não pode ser esquecida ou ignorada quando se fala do legado destas máquinas incríveis.
Neste tempo, era testado nos Estados Unidos o mais promissor tipo de locomotiva a turbina que já existiu. o GTEL (Gas Turbine-Electric Locomotive).
A GE desenvolvia para a Union Pacific Railroad (UP) a tão esperada combinação de uma moderna e bem resolvida turbina a gás aliada a eficientes motores elétricos de tração. Era simplesmente o último nível de locomotiva, nada como ela havia sido feito. É como se todos os tipos de aperfeiçoamentos e melhorias desde os tempos de Cugnot tivessem atingido seu ápice com esta máquina. Nada antes dela poderia se equiparar e tudo que viesse após seria frutos seus.
Era o estado de arte da locomotiva. Uma verdadeira jóia da engenharia férrea que elevava todo o conhecimento científico de mecânica e eletrônica no seu mais alto nível.
Realmente, os responsáveis pelo seu desenvolvimento não queriam repetir os equívocos daqueles que se proporam a construír as máquinas "turbinadas" de algum tempo atrás como vimos. E com certeza foi isto mesmo que aconteceu.
O primeiro protótipo destas máquinas apareceu ainda nos anos de 1930 e serviu para dar forma ao projeto, mas em 1952 sua primeira geração foi finalmente apresentada.
Constando de uma aparência "cab-unit", muito comum na época, com linhas arredondas e aerodinâmicas somado à oito eixos divididos por quatro truques sendo todos motorizados e um vagão tender de seis eixos servindo de tanque de combustível, esta é com certeza uma das mais bonitas locomotivas que já tivemos.
Seu visual futurista e agressivo fazia jus à sua mecânica.
Com um turboshaft GE de 15 estágios girando à máxima de 6.900 RPM para produzir 4.800hp e acionando seu gerador através de um sistema de redução, produzia potência líquida de 4.500hp e um esforço contínuo de tração de 105.000 libras! Simplesmente o mais alto até então.
Em 1954 e segunda geração foi apresentada visando corrigir alguns "problemas", entre elas o alto consumo de combustível quando na lenta e o ruído excessivo. Sendo portanto uma leve evolução, sem alteração de estilo e com basicamente os mesmos componentes.
1958 a terceira e última geração então apresentada foi uma máquina bem diferente e muito mais impressionante. Constava de duas unidades permanentemente acopladas mais o tender, com a unidade "A" equipada com a cabine, o sistema de controle e um motor diesel auxiliar juntamente com seu gerador. Na unidade "B" estava a turbina mais o gerador principal. Trabalhando "A" e "B" juntos rendiam expressivos 8.500hp disponíveis para tração! Simplesmente a mais poderosa locomotiva de combustão interna e externa (vapor) já construída!
Consta que a GE não estava conseguindo sanar os "problemas" das gerações anteriores e achou conveniente aplicar um confiável e durável diesel para livrar um pouco a carga da turbina conseguindo assim poupar um pouco de combustível e reduzir seu ruído quando em plena carga.
Vizualmente, seu design era o mesmo, com linhas arredondadas ao estilo da época mas seu arranjo de rodas foi bem alterado. Desta vez cada unidade recebia um par de truques de três eixos somando assim quatro truques com um total de doze eixos motrizes! Obviamente, com tanta tração, seu esforço aumentou, passando para brutais 146.000 libras contínuas.
Comenta-se que durante seu desenvolvimento, sua potência estava prevista para render 10.000hp (!) mas a GE a baixou devido a limitações de seu equipamento elétrico já que na época o alternador de tração ainda era novidade e o controle eletrônico por computador um sonho distante.
Infelizmente foram retiradas de funcionamento precocemente em 1970. Mais uma vez vemos máquinas grandiosas sucumbirem, não desta vez por falhas ou defeitos, pois a experiência nos ensinou a construí-las mas pela famosa crise do petróleo dos anos 70 (que com certeza irá se repetir, mas desta vez de forma definitiva). Mesma crise que acabou comos gloriosos "muscle cars" americanos, os famosos carrões V8. Mencionemos também que foram locomotivas com grande potencial mas foram mal compreendidas e que carregam ainda hoje (ainda mais, hoje), uma legião de fãs que nunca se esqueceram do animalesco grito de sua turbina. Máquinas que estiveram mais do que nunca muito afrente de seu tempo e que carregam orgulhosamente o título de serem as últimas locomotivas a turbina que existiram. Mas como já foi falado, motores a pistão de ciclos diversos estão fazendo hora extra por aqui e as novas tecnologias de propulsão mais limpas, simples e econômicas estão se aproximando cada vez mais de nós (embora conservadoras empresas ainda insistem nos pistões). Quem sabe o que o futuro nos reserva...

O PAPEL DAS ELÉTRICAS

A eletrificação sempre foi um motivo de grandes discusões entre os governantes e empresários ferroviários. Pois como já visto, abrange uma gigantesca infra-estrutura que estrapola o âmbito puramente técnico e atinge mais do que qualquer outro sistema de transporte terrestre a esfera sócio-política de uma região ou um país. O que nos leva a crer que os mais bem estruturados e desenvolvidos países são eletrificados tais como países Europeus além de Japão.
Obviamente, a eletrificação ferroviária gera custos inacreditáveis se não bem estudada e resolvida, mas quando o sistema é propício e muito bem planejado, apresenta muitas vantagens que jamais poderiam ser alcançadas por outro meio de transporte. Não se engane, estamos caminhando mais uma vez para um sistema férreo quase que completamente elétrico por motivos mais do que óbvios (fim do petróleo, poluição, redução dos custo de manutenção, agilidade, segurança, etc...).
Locomotivas e principalmente trens elétricos são sinônimos de cidades grandes e desenvolvidas. Basta dizer que não existe metrópole que funcione sem um bom sistema de metrôs e trens urbanos (São Paulo!). E estes não poderiam funcionar com eficiência se não fossem elétricos embora haja trens urbanos múltipla-unidades movidos com transmissão diesel-mecânica ou diesel-hidráulica, mas não são comuns e não apresentam qualidades de um sistema completamente elétrico relegando-os à linhas secundárias e de tráfego com pouca densidade. Realmente, hoje considera-se o metrô a única solução para São Paulo, com seu trânsito cada dia mais ordinário e com data o hora marcada para atingir o inevitável colapso. Coisas de Brasil, um país de terceiro mundo que não nega nem foge à regra e que sempre será assim (nunca duvide disto).
Lembremos que trens não são soluções só para grandes cidades sem planejamento, mas para qualquer tipo de aplicação. Trem é sempre bem vindo e nada como um trem que seja totalmente elétrico, utilizando com a eficiência de seus motores a energia que pode ser conseguida sem problemas de fontes baratas, limpas, abundantes e renováveis.
Como já mencionado, locomotivas elétricas co-existiram e co-existem com várias outras modalidades de locomotivas (vapor, diesel diversas, gás turbina, etc) e nunca deixaram seu posto máquinas brilhantes para
qualquer tipo de serviço, como um veloz trem de passageiros ou um pesadíssimo trem de carga. Locomotivas elétricas assistiram as máquinas a vapor nascerem, evoluírem e morrerem pelas mãos das diesel que diante
delas, também nasceram, evoluíram e ainda evoluem e com certeza (infelizmente) morrerão enquanto as elétricas se manterão firmes e fortes nos seus postos. Postos que com certeza se expandirão a partir da morte eminente das máquinas equipadas com o arcaico motor de Rudolf Diesel e assim elas finalmente triunfarão em um futuro livre do maldito petróleo.
Embora soe como profecia, é isto mesmo que acontecerá. Não se deixe enganar por biodiesel ou etanol (já encheu o saco isso!). Isso é "papo pra boi durmir". Conversa de governo populista querendo fazer o povão
acreditar que descobrimos a fórmula mágica para por fim definitivo em todos os problemas relacionados com o petróleo. Mesmo povão que acredita que a "incrível tecnologia de carros flex, uau!!" é realmente uma criação brasileira. Saibam que nos anos 70, com a crise do petróleo que se abateu nos EUA obrigou a indústria automotiva desenvolver motores que possam funcionar tanto com gasolina como metanol, e isso com carburador!
Simplesmente é impossível alimentar a frota mundial de veículos só com esses combustíveis. Realmente deixaremos de nos alimentar para alimentar nossos carros.
Nossos governantes sempre foram míopes. Alguém sabe o por quê de não termos carros com motores diesel por aqui? Simples, por culpa dos caminhões. Isso porque na metade do século 20, um certo presidente ao
invés de investir em ferrovias, o que seria natural em um país continental como este, preferiu as rodovias para assim atrair fabricantes de veículos automotores para cá. Deu certo, tanto que isto foi chamado de "milagre econômico", pois o país cresceu muito, muito rapidamente e com tantas rodovias (precárias, diga-se de passagem) e poucas ferrovias, é óbvio que o transporte majoritário de cargas seja feito sobre pneus. Com isso o jeito foi baratear o diesel com alíquotas menores para que o preço do frete e conseqüentemente o preço final das mercadorias seja barateado. O governo é míope mas não é burro. Com o diesel barato devido a baixos impostos, cada carro com motor alimentado com este combustível que saía da loja fazia automaticamente com que o governo deixasse de arrecadar como queria e o jeito foi proibir a venda de carros diesel por estas terras restando para nós apenas carros dotados de motores a gasolina ou álcool. Combustíveis gordos de impostos. Genial, não?
O fato é que agora os motores diesel são muito populares pois são mais eficientes, consomem bem menos que um similar Otto e possuem ótimo desempenho embora também estejam no seu limite e tecnologias futuras
não terão pena dele (embora fabricantes relutem a isso, como já mencionado). Tanto que existem carros Europeus que possuem mais versões diesel do que gasolina e isto é um fato irreversível que tende a aumentar. Como podemos deduzir, em pouco tempo seremos um país com tecnologia automotiva dezatualizada pois os motores do ciclo Otto estão pouco a pouco perdendo terreno até que sejam quase que completamente excluídos das pranchetas dos engenheiros automobilísticos. Basta ver a frota dos nossos vizinhos argentinos, paraguaios, uruguaios ou chilenos. Todos com carros equipados com econômicos motores diesel enquanto nós temos que nos contentar com nossos obsoletos e beberrões carros com seus motores ineficientes que pouco a pouco se tornarão apenas uma curiosidade de museu.
Isso é que eu chamo de falta de visão de futuro, pessoas que enchergam apenas o que está diante de suas caras sem querer saber o que virá depois. Míopes!
Como visto, as primeiras locomotivas elétricas eram alimentadas por baterias e como não poderia ser diferente, eram extremamente limitadas devido principalmente a isto. Nesta época, Siemens testava na Alemanha um tipo de locomotiva que provia sua energia de fonte externa, que no caso era um terceiro trilho de alimentação e garantia a ela um desempenho brilhante.
Em 1880 o engenheiro naval americano Frank Julian Sprague (1857-1934) apresentou o trolley elétrico por catenária (cabo aéreo de alimentação) e em 1894 Kálmán Kandó (1869-1931) engenheiro húngaro adaptou um motor elétrico CA trifásico de alta tensão para o uso ferroviário, sendo a primeira aplicação de corrente alternada na história das estradas de ferro e devido a isso é considerado o pai do trem elétrico.
A primeira linha eletrificada que se tem registro data de 1895 nos EUA, batizada de Baltimore and Ohio Railroad (B&O) e partir destes citados acontecimentos, linhas elétricas não pararam mais de serem construídas em vários países pelo mundo apresentando enormes vantagens sobre a tração a vapor que até então reinava absoluta.
A grande vantagem de se ter uma linha elétrica reside principalmente na própria locomotiva que em geral é bastante simples do ponto de vista mecânico. Consta de um sistema de captação (pantógrafo para cabos aéreos ou sapatas para terceiro triho), sistema de controle e motores elétricos ligados diretamente à rodas. A manutenção destas máquinas é extremamente reduzida e conseqüentemente seu custo é baixo além do que suas quebras são quase nulas.
Curioso mencionar que as primeiras locomotivas elétricas eram dotadas de braçagens para levar o torque dos motores até as rodas mas em pouco tempo eles passaram a serem montados nos truques exatamente como nas
diesel-elétricas de hoje, embora ainda existam locomotivas com braçagens como a Hitachi de cremalheira da MRS, que atua na serra do mar em Cubatão-SP.
Embora uma locomotiva elétrica seja muito simples em termos físicos, do ponto de vista elétrico a coisa se inverte chegando a ser muito complexo e caro. Portanto esse é seu ponto crucial pois a energia captada não está pronta para ser utilizada nos seus motores já que uma linha pode ter dezenas de locomotivas diferentes, com potências mais variadas e dedicadas aos mais diversos usos sendo que a energia oferecida a todas é a mesma e como podemos deduzir em uma tensão elevadíssima que pode chegar a 50.000V CA (50kv).
No início era utilizado linha em corrente contínua (CC) a uma tensão máxima de 3.000V. Seguindo o desenvolvimento da eletrônica de potência, tornou-se padrão linhas de corrente alternada (CA) em alta tensão,
acima de 25.000V pois as perdas com CC são muito maiores pois há necessidade de alta corrente também, normalmente 1000A (quanto maior a corrente maiores são as perdas), sendo assim é requisitado catenárias de maior espessura que são mais caras. Outro problema da linha CC reside nas subestações. Quanto maior a corrente maior é a perda, portanto previne-se isto instalando várias subestações ao longo da linha. Elas encontram-se entre 10 e 50km uma das outras, enquanto uma linha CA a necessidade de subestações é bem
menor, 100km ou mais as separam. Mencionemos também que quando a energia é comprada no mercado ela é
naturalmente CA (temos CA em nossas casas!) e deve ser retificada para CC antes de ir para a catenária. Este processo é feito pelas substações que recebem a energia da fonte. Um tipo comum de retificação é por
"transformador rotativo". Um motor CA acionado um gerador CC. Mais recentemente este processo é feito através de tiristores, que possuem perdas muito menores e é mais barato além de não darem manutenção.
Embora uma linha CC apresente problemas na rede de transmissão, na locomotiva ou trem EMU (Electric Multiple Unit) acontece o inverso. Como seus motores são naturalmente do tipo CC série (por motivos já vistos), basta aplicar a tensão apropriada para a velocidade desejada já que os motores deste tipo são controlados diretamente pela tensão. Quanto maior a tensão maior será a velocidade. Portanto, sabemos porque as primeiras locomotivas elétricas era acionadas por CC (muitas ainda são), pois nelas controla-se a velocidade de um jeito simples e descomplicado.
Quando a catenária recebe CA, há a necessidade de locomotivas mais elaboradas porém mais poderosas e a linha de transmissão pode ser mais "limpa", com menos perdas e menos custos pois como vimos, necessita de menos subestações. Normalmente as locomotivas recebem CA que é retificado nelas mesmas através de tiristores ou transformador rotativo (nas mais antigas) para CC pois seus motores são do tipo série, embora possa-se utilizar corrente alternada diretamente neste tipo de motor, mas desta forma, o rendimento tende a cair pois motores série quando alimentados com CA apresentam dificuldades para trabalhar com tensão e corrente em níveis ferroviários.
Motores série quando projetados para funcionar com CA são denominados motores "universais" e são muito comuns em nosso cotidiano, sendo presente em eletrodomésticos que exigem bom torque de partida como por
exemplo furadeiras e liquidificadores. Motores como de ventiladores, circuladores de ar ou geladeiras já são do tipo CA de indução monofásico. Estes são mais econômicos, silenciosos e podem trabalhar por tempo prolongado apesar que seu baixo torque. Como podemos deduzir, não podemos utilizar este tipo de motor em locomotivas pois além de sua pequena força, eles não tem partida própria sendo necessário um sistema para isto, como por exemplo sistema de capacitores de partida, pólos sombreados, fase dividida entre outros.
Analizando amplamente, podemos ver que o motor CC série é ideal para se acionar uma locomotiva tanto elétrica como diesel-elétrica. Mas a evolução não pára e como não poderia ser diferente, o brilhante motor
CA de indução trifásico não poderia deixar de ser tentado. O problema deste motor está justamente na sua alimentação trifásica, ou seja, é necessário três linhas de corrente exigindo portanto três catenárias ou duas e mais um terceiro trilho, o que é visivelmente inviável tanto do ponto de vista técnico como econômico.
Aí que entra a eletrônica de potência. Ramo da eletrônica que abrange o funcionamento de máquinas de alta potência e a conversão de CC para CA ou vice-versa.
Embora retificadores (conversão CA-CC) existem a bem mais tempo, os inversores (conversão CC-CA) são recentes. Datam dos anos 80 através dos inversores GTO e mais recentemente os inversores IGBT.
Inversores GTO (Gate Turn-Off thyristor) ou IGBT (Insulated-Gate Bipolar Transistor) são tipos especiais de semicondutores de alta potência. Captam corrente contínua e através de um sistema de "válvulas" que se abrem e fecham em alta velocidade conseguindo assim um pulso alternado, ou seja CA. Portanto, através de CC se pode obter CA monofásico, bifásico, trifásico, etc. Dependendo da construção do circuito, pode-se obter corrente alternada de qualquer forma que for desejado!
Sendo assim, uma locomotiva elétrica pode perfeitamente ser equipada com motores de tração trifásico sendo alimentada por catenária monofásica. Dentro da máquina, a corrente altenada em alta tensão é retificada para CC e logo em seguida invertida para CA trifásico com freqüencia e tensões apropriadas ao uso em seus motores e ainda pode-se controlar sua velocidade e torque com incrível eficácia, sem o uso de qualquer outro dispositivo, como é nas máquinas com motores CC.
Eletrificar uma ferrovia não é coisa das mais simples. Quando se utiliza alimentação aérea por catenária, o cabo deve ser esticado a uma tensão de 2 toneladas para que não deforme ou saia do lugar quando passar o pantógrafo por ele. Tem que ser resistente a chuva, ventos, frio intenso que pode chegar a menos de zero graus (EUA, Europa) ou calor extremo (Brasil) e mesmo assim não pode deixar de cumprir seu propósito. Qualquer pequena avaria que ocorrer a ele, compromete toda a linha e prejudica o desempenho dos trens além do que, sua manutenção é trabalhosa e muito prejudicial economicamente (tempo é dinheiro!). Portanto, a construção de um sistema de catenária exige cuidados que são indispensáveis à seu bom funcionamento.
Sistemas de terceiro trilho são utilizados comumente em metrôs e quase sempre com corrente contínua. Metrôs, como podemos imaginar, não pode utilizar sistema de catenárias, pois isto seria inviável sob o chão. Sendo assim, este sistema empregado na sua alimentação vem bem a calhar. Além disto, terceiro trilho apresenta um enorme risco para civis que transitam no lugar e em túneis de metrô obviamente não existe movimentação de pedestres ou qualquer tipo de veículo, afastando assim o risco de acidentes. Mencionemos que hoje em dia, catenárias são utilizadas sempre em corrente alternada e terceiro trilho tanto pode trabalhar com corrente alternada como corrente contínua e, como visto, este é o mais comum pois são sempre utilizados em trens de passageiros múltipla-unidade, ou seja, metrôs, que são o melhor exemplo deste tipo de trem e transitam em percursos relativamente curtos sempre em perímetro urbano. Trem múltipla-unidade ou EMU (Electric Multiple-Unit) são um tipo de trem em que a locomotiva física não existe. Todos os carros ou vagões cumprem um papel como por exemplo o primeiro carro sendo responsável pelo controle, o segundo carro servido de tração, o terceiro com o sistema de compressor de ar para os freios, o quarto servido também de tração, etc. Este tipo de trem pode ter a formação que a companhia operadora quiser. Normalmente, os trens metropolitanos possuem o primeiro e o último carro motorizados, possuindo cada um deles seu próprio pantógrafo. Metrôs já possuem tração em todos os carros, sendo que cada carro possui dois truques com dois eixos e normalmente apenas um deles é dotado de motor, possuindo assim dois motores para cada carro e cada truque possui sua sapata coletora (terceiro trilho).
Trens de alta velocidade também são máquinas múltipla-unidade. O famoso e poderoso TGV francês possui quatro motores no primeiro e mais quatro no último carro. Já o alemão ICE possui motores em todos os eixos de todos os carros assim como o japonês Shinkansen. O desempenho alcançado por esses trens comprova a eficácia deste sistema. Só por curiosidade o recorde de velocidade sobre trilhos pertence ao TGV. Nada menos do que 574,8km/h alcançados em Abril de 2007 e já se fala em uma nova tentativa para superar os 600km/h! O mercado de super-trens está realmente pegando fogo!

O FUTURO

Se existe um meio de transporte que podemos dizer que realmente tem futuro, este meio de transporte é o trem. Com o preço do petróleo nas alturas, obviamente o custo do transporte aumenta mas os trens são os menos afetados pois o custo de se transportar sobre trilhos é consistentemente mais baixo já que como sabemos, ele é o meio de transporte mais eficiente que existe e quanto mais pesado for, mais eficiente será. Vendo desta forma sabemos que qualquer esforço para o benefício de se conseguir mais eficiência com a conseqüente redução de
custo operacional é transformar o que já é bom em melhor ainda. Deduzimos que a médio prazo, podemos ter novas linhas sendo construídas por vários países afora e mesmo linhas que outrora foram desativadas, podem naturalmente serem postas de volta à circulação de trens. Pois trem é um avanço na logística e algo indispensável com o aumento constante do tráfego de carga além de exportações em expansão permanente e obviamente a pressão de um mercado cada vez mais competitivo e obsecado por contenção de custos. Esta é uma visão lógica de futuro, no qual o transporte férreo possa se expandir livremente reduzindo com isso seu custo produzindo assim uma reversão: A ferrovia sobre a rodovia.
O futuro do transporte férreo reside principalmente nisto. Redução de custo por tonelada transportada. Uma locomotiva de 3.000hp de tração, média potência para os padrões brasileiros puxando um trem de 50 vagões
com 100 toneladas cada a uma velocidade de 50km/h no plano, consome mais ou menos 8 litros por kilometro. Compare estes números com os do seu carro e verá o quanto você está em desvantagem. Contribui para isto o fato de que a área de contato entre as rodas do trem com a linha é de alguns milimetros enquanto os pneus de borracha cheios de ar de um carro ou qualquer veículo rodoviário que seja, abrange uma área muito maior, se deforma e produz atrito gerando arrasto e portanto jogando litros e mais litros de combustível fora, além de fatores inerentes ao próprio motor automotivo. Que já vimos e estamos cansados de saber o quanto são ineficientes e precários. Com o fim do petróleo próximo e os combustíveis derivados deste com o preço aumentando, uma diesel-elétrica pode trabalhar muito bem com o biodiesel. Mas a tecnologia não pode parar por aí e soluções técnicas a curto prazo para o aumento da eficiência da tração sobre trilhos já estão ocorrendo. A GE com a linha Evolution de locomotivas (ES40DC, ES44DC e ES44AC), substituiu o motor 7FDL-16, com dezesseis cilindros pelo GEVO-12, com doze cilindros sem reduzir a potência disponível para tração: 4.400hp. Conseguiu isto com um motor com arquitetura interna totalmente refeita, redução de atritos internos, redução de peso dos componentes e implantação de um controle eletrônico computadorizado, que adapta em tempo real o funcionamento do motor às condições de uso com precisão cirúrgica (como se diz no ditado), além de constantes melhorias no sistema elétrico. Obviamente, com quatro cilindros a menos, a locomotiva irá consumir menos além de emitir menos poluentes e de quebra se reduz seu custo de produção, reduzindo-se assim seu preço final conseguindo com isso aumentar suas vendas.
A EMD segue o mesmo caminho. Quando substituir o 16-710G3C pelo 12V265H-Engine, estará trocando um motor de dezesseis cilindros a dois tempos (cada revolução da árvore de manivela representa um golpe de potência enquanto o motor a quatro tempos tem um golpe de potência a cada dois giros da árvore, portanto o dois tempos tem potencial para produzir duas vezes mais poder com duas vezes mais consumo) por um
moderno doze cilindros a quatro tempos. Teremos então EMDs com som de GE para o desespero dos puristas!
Outro fato sobre a EMD consta que ela estaria firmando contrato com a Caterpillar para o fornecimento de motores pequenos (até 2.000hp) para a construção de locomotivas de pequeno porte e híbridas. Este é um fato
muito interessante pois a EMD hoje produz apenas os motores da linha 710 e os 265 apenas sob encomenda ou para teste.
As locomotivas diesel-elétricas que sempre evoluíram em prol da potência, esforço de tração, tamanho e peso, ao que vemos estão encolhendo em prol da eficiência. Nos anos 70 tínhamos máquinas colossais equipadas com dois motores-gerador como a ALCo C855, GE U50 e a EMD DDA40X além da sua precursora DD35A. Sem contar a velha Baldwin DR-12-8-1500/2 da década de 40, batizada carinhosamente de "Centipede" (centopéia). Descontando a Baldwin, eram máquinas que dispunham de um total de 32 (!) cilindros em seus motores. Mais recentemente (anos 90), apareceu a EMD SD80MAC-H com seu gigantesco motor de 20 cilindros a dois tempos. Máquinas que hoje em dia seriam impensáveis. Com novas tecnologias surgindo, naturalmente novas empresas estão se apresentando, entre elas a Rail Power e a Motive Power Industries (MPI). Estas apresentam locomotivas híbridas batizadas de "Green-Goat".
Com um motor diesel pequeno, não maior que um 6 cilindros acionando um gerador que envia corrente para um grande banco de acumuladores. Este que fornecerá energia para seus motores elétricos de tração. O sistema
é um tipo de híbrido-série, ou seja, a corrente do gerador e a das baterias ligados em série propelem a máquina e os acumuladores ainda absorvem energia durante a frenagem dinâmica ao invés de queimá-la em uma grade de resistores como fazem as diesel-elétricas convencionais. São locomotivas ainda experimentais mas que tem tudo para darem certo, pois o maior problema dos carros híbridos é justamente o tamanho e peso do pacote acumulador. Problema que obviamente não existe em uma locomotiva, sendo permitido carregar dezenas de toneladas de baterias. Por enquanto estas máquinas são utilizadas apenas como manobreiras em pátios e em percursos pequenos. Sua potência para tração é de ótimos 2.000hp para um motor diesel de apenas 500hp. Não tenho dúvidas que são promissoras e uma tecnologia que veremos muito no futuro. Vendo estas máquinas, podemos imaginar uma locomotiva híbrida-paralela.
Com o motor diesel tracionando através de uma caixa de engrenagens em regimes de velocidades mais altas, condição na qual o motor a pistão é bem eficiente e em velocidades baixas os motores elétricos fazendo seu
serviço. Exatamente com em um carro híbrido. Com certeza este tipo de tração seria caro mas com ele pode-se reduzir o risco de quebra da transmissão pois a carga ficaria dividida entre o motor diesel e o elétrico. É apenas uma suposição, não espere ver uma destas pelos próximos 20 anos!
Outra empresa, a National Railway Equipment (NRE) vai por outro caminho. No lugar do banco de baterias somado a um pequeno motor-gerador das Green-Goat, ou um grande, pesado e caro diesel com um
igualmente grande, pesado e caro gerador das diesel-eletricas, ela optou por três pequenos motores diesel de 6 cilindros acionando cada um seu próprio gerador. A vantagem deste sistema consiste em se ter motores baratos e que podem ser comprados prontos para o uso de diversos fabricantes como por exemplo a Cummins, sua fornecedora. Atualmente a NRE fabrica três modelos de locomotivas, culminado na 3GS21C. Uma grande "roadswitcher" de seis eixos (fornecidos pela EMD) e 2.100hp de tração. Realmente uma máquina barata, econômica, de manutenção relativamente simples e muito forte.
Temos também a Brookville Equipment. Esta produz a BL20GH, uma locomotiva média pequena muito parecida com as EMD G22. Com truques de dois eixos e equipada com um motor MTU DD 4000-12 de dois tempos acionando um alternador KATO. Esta locomotiva é também econômica e barata com seus 2.000hp de tração. Rail Power e MPI não produzem apenas Green-Goats. Produzem também locomotivas diesel-elétricas convencionais como a BL20GH e igualmente a ela, são máquinas para serviços gerais que esbanjam eficiência e
apresentam um custo benefício muito favorável. Máquinas de futuro mas não se engane. Estas empresas não tem nenhum interesse em produzir locomotivas de potência acima de 3.000hp, pois entrariam em choque com GE e EMD e a tecnologia que estas novas empresas produzem é ainda experimental, não sabemos se podem atingir tal nível sem que seu rendimento e eficiência caia por terra, além de seu preço.
Vemos que o mundo tecnológico ferroviário está organizado. Temos nos EUA quatro fabricantes de locomotivas de baixa potência apresentando soluções e dois fabricantes de locomotivas de média-alta potência também com suas soluções para o futuro. Tradicionais fabricantes de máquinas a vapor e que tentaram a vida com máquinas diesel durante o período de dieselização sucumbiram. Entre eles a ALCo, Baldwin, Lima e Faibanks-Morse (esta última viveu pouco e chegou depois da era a vapor enquanto a Lima rapidamente se uniu com a Baldwin, formando a BLW - Baldwin-Lima-Westinghouse, no início da era diesel) e quatro novos fabricantes chegaram, embora ainda sejam pequenos. A indústria encontrou um caminho e a lacuna aberta está para ser fechada. Veremos agora se a GE e a EMD irão se adaptar a novos tempos e evoluirão de acordo com as novas tecnologias. A GE já está testando uma locomotiva híbrida com acumuladores desde 2006, caracterizada pela pintura totalmente verde. Espero ver a EMD também se mexendo neste sentido!
Vimos até agora as novas tecnologias e soluções a curto prazo, mas, como mencionado mais acima, o futuro férreo tende para um retorno definitivo da eletrificação. Isto é um fato natural na evolução e razão a favor de se obter uma fonte de energia promissora para os tempos de mudança que estão por vir.
Locomotivas elétricas são as melhores máquinas que existem e não tem como contestar isto. Mas para desfrutarmos de seus benefícios, temos que evoluir e nos organizar sem que haja interesses manipulando contra
a eletrificação. Encontramos barreiras principalmente em sua fonte energética. Usinas.
Um país como o nosso em que o grosso da energia elétrica é produzido em hidroelétricas, não é difícil deduzir que temos fatores naturais nos ajudando a ser uma terra quase que completamente eletrificada. Mesmo porque, não seria difícil de se construir usinas dedicadas para ferrovias sem que seja necessário construir uma de grandes proporções. Penso também que caso a demanda elétrica exceda a capacidade desta usina, pode-se comprar uma parcela dela sem problemas a um custo razoável, pois o grosso provém da própria usina ferroviária.
Com certeza absoluta, houve e há jogo de interesses quanto a isso. Hoje e cada vez mais no futuro, sofreremos do malefício de sermos um povo tão pobre de espírito que se vende descaradamente aos interesses de uma
minoria.
Quanto aos EUA a coisa acaba se complicando por um lado (fatores naturais, falta de rios para hidroelétricas) mas por outro lado a coisa se simplifica (menos lobby, população com cultura). A dieselização americana se deu por fatores lógicos como a falta de rios para hidroelétricas, que produzem energia abundante e renovável a um custo ínfimo perante seu benefício. Sendo assim, as diesel proliferaram. Se lá tivesse tantos rios como aqui, com certeza ao invés de país das diesel-elétricas, seria o país das elétricas.
Com o fim do petróleo, a escasses de água, tecnologia de energia solar sendo ainda insuficiente para este feito assim como a energia eólica, a única solução para uma possível e completa eletrificação em solo norte-americano seria a tecnologia das usinas termonucleares.
Não se engane. Uma usina nuclear pode sim ser a solução para o futuro. Temos que nos afastar do preconceito que temos a respeito desta tecnologia que com certeza será cada vez mais utilizada em um futuro quente, seco e sem petróleo. Trata-se de uma energia duradoura a um custo de uma hidroelétrica correspondente. Não temos como fugir, em algum tempo teremos energia elétrica em nossas casas proveniente de usinas termonucleares!
E quando ao vapor? poderemos ter a volta das máquinas a vapor?
A resposta é mais do que nunca sim. Basta parar e pensar um pouco. As reservas carboníferas são suficientes para mais de 200 anos, visando o consumo atual de hulha. Ou seja, o petróleo acabará e ainda teremos mais de 150 anos de carvão pela frente e ainda não estamos afobados para encontrar mais como fazemos com o petróleo! (a Petrobrás tá sempre se gabando anunciando que encontrou mais e mais petróleo em águas profundas). E com o carvão ainda temos uma vantagem: Nos afastamos do consumo desenfreado popular (carros de passeio) que não para de crescer.
Outro fato interessante. Ao invés de hulha podemos utilizar lenha, que como sabemos é renovável. Basta plantar árvores com este propósito. Ou seja, podemos intercalar o consumo de hulha com lenha triplicando o tempo de duração das reservas deste último. Não tenho mais dúvidas, locomotivas a vapor que foram exterminadas de nossas linhas tem tudo para dar a volta por cima e nos mostrar mais do que nunca que neste mundo tudo é cíclico. O que hoje não tem mais valor nenhum, amanhã pode ser a nossa salvação!
De imediato, poderemos ter a volta das rod-steam 100% originais trabalhando normalmente. Mas como não poderia deixar de ser, melhorias seriam bem vindas e fatalmente ocorreriam (afinal de contas, este design de locomotivas datam de mais de 150 anos!). Principalmente no que diz respeito à emissão excessiva de fumaça, baixo rendimento térmico e quanto à transmissão de potência às rodas.
Em 1980 uma empresa denominada American Coal Enterprises (ACE) era fundada nos EUA com este mesmo propósito. Aproveitar a abundância de carvão mineral americano que possuía sua capacidade de demanda ociosa e naturalmente a um baixo custo enquanto o preço do petróleo decolava. A locomotiva que nunca chegou a ser construída foi batizada de ACE-3000, mas se tivesse sido, com certeza seria muito interessante.
Trata-se de uma re-edição da máquina a vapor com transmissão por braçagens sendo que durante o período de estudo foi levado em conta que mesmo com uma eficiência térmica baixa, 15% contra os 30% das máquinas
diesel equivalentes, o baixo custo do carvão permitiria que sua implementação fosse mais rentável do que as máquinas alimentadas com o combustível líquido. Seu projeto não saiu do papel embora existam vários desenhos de sua aparência final. Trata-se de dois carros permanentemente acoplados, cada um com sua cabine sendo que apenas o primeiro é dotado de tração e o segundo sendo rebocado. Contava com uma carenagem muito parecida com as diesel e sua transmissão era por cilindros de duplo efeito munido de braçagens para transferir a potência para as rodas, possuindo um total de quatro cilindros (dois de cada lado da máquina, um oposto ao outro) e um total de quatro eixos motrizes. O primeiro carro (o de tração) continha a caldeira por tubo de fogo e
no segundo estava o reservatório de água e de carvão. Embora existam algumas poucas informações sobre esta máquina, como não chegou a ser construída é um tanto difícil precisar informações, havendo contravensa no que diz respeito a seus dados técnicos, mas ao que consta, ela seria muito parecida (por que não evolução) esquematicamente das locomotivas a vapor do tipo Garratts, embora isto seja apenas uma dedução julgando
por alguns de seus desenhos.
Quanto a utilização de motores a vapor e braçagens de transmissão. Esta foi motivada pela longa experiência de mais de 1 século de estudos e como não deixa de ser, este "currículo" proporciona custos de desenvolvimento e produção baixos além de ser uma forma de tecnologia muito conhecida e difundida dentre os engenheiros ferroviários, mas outras formas foram pensadas como por exemplo a turbina a vapor.
Infelizmente, durante os anos 80 o diesel combustível teve uma queda acentuada nos preços que reduziram o interesse por essa tecnologia, além de verbas governamentais e incentivos, que para variar, nunca se concretizaram. Sem mencionar que grandes fabricantes de locomotivas não tinham obviamente interesse na volta do vapor, por motivos que já sabemos.
Mas isto é passado. Nos anos 80 ninguém falava de fim do petróleo e seu preço era ínfimo. Mas a partir da agora e cada vez mais no futuro, isto é uma realidade implacável e irreversível.
Além da ACE-3000, no mesmo período houveram também outros estudos a respeito de uma possível re-implantação de tração a vapor, como por exemplo a CE-635 da National Steam Propulsion Company (NSPC) de 1982. Equipada com um motor a vapor a pistão acionando um gerador que enviaria corrente para os motores elétricos de tração, sendo portanto uma locomotiva "steam-electric". Uma re-edição moderna da remota
Heilmann.
Vemos que nunca a propulsão a vapor foi completamente esquecida e isto é mérito de alguns poucos empresários e engenheiros que instintivamente prevêem que em pouco tempo, algo de surpreendente e fantástico estaria por acontecer. Algo que revolucionaria a forma como concebemos nossas locomotivas e que pudesse medir forças com as diesel e estas, adoecidas pelo preço abusivo do petróleo, sucumbiriam diante desta nova máquina. Máquina que preenche os sonhos destes que sempre souberam que em algum ponto no futuro, teriam a redenção completa pela locomotiva a vapor definitiva. A verdadeira "máquina dos sonhos".
Imaginar esta "máquina" é realmente algo fabuloso e que mexe com a imaginação de qualquer entusiasta por locomotivas, como este que vos escreve. Imaginá-la seria uma forma de juntar as melhores qualidades e até as não melhores, mas as que mais gostamos, de todas as grandes locomotivas da história em uma única e grandiosa máquina, com direito a exageros e até mesmo "luxos", dignos de um sonho no qual não existe limites técnicos nem econômicos para tal. Pensando mais racionalmente em uma máquina que seja funcional, podemos ver algo próximo de uma M1 Turbine ou uma Jawn Henry, dos anos 40 e 50 (se é que podemos chamar esses monstros de quase 400 toneladas de máquinas racionais!), sendo portanto uma "steam turbine-electric". Imaginemos que em 15, 20 ou 25 anos teremos uma máquina gigantesca equipada com uma caldeira por tubo de água com circulação forçada ao invés da tradicional por tubo de fogo, já que este sistema permite uma área menor de instalação além de ser mais leve. Esta caldeira seria alimentada por uma fornalha que trabalharia indiferentemente com carvão ou lenha triturados, que seriam lançados nela através de um sistema automatizado de esteira e lâminas, dispensando assim um foguista. Todo o vapor gerado é então enviado a uma moderna e leve turbina de alta rotação, trabalhando com o vapor a uma temperatura deduzida superior a 600º e com uma pressão acima de 600 psi (pound per inche), pois nas últimas e mais poderosas máquinas a vapor, atingiam pressões de quase
300 psi. Portanto, não seria difícil mais que dobrar este número utilizando tecnologia moderna. Este, através de um sistema de redução aciona então um alternador síncrono que por sua vez alimenta os motores elétricos de tração CA, naturalmente.
O vapor saturado ao invés de ser expelido para fora da máquina depois de seu uso, é enviado para um condensador, voltando assim à forma líquida para então voltar para a caldeira. Desta forma, teríamos o
vapor em um circuito fechado não sendo necessário parar para reabastecer, evitando-se um comum inconveniente da época de ouro das vapores.
Esta máquina seria equipada também com um bom banco de acumuladores, que absorveria energia durante a frenagem dinâmica e poderia utilizá-la como um "booster", dando força extra momentânea para seus motores de
tração durante a partida ou em situações de grande demanda de potência, além de poderem impulsionar a máquina em manobras em pátios ou quando se aguarda a pressão na caldeira atingir pressão elevada suficiente.
Também pode-se acelerar o aquecimento da caldeira com sua corrente elétrica através de resistências e ainda acender a fornalha como se fosse um grande forno. Enfim, com o recurso dos acumuladores, os benefícios podem ser muitos.
Como já mencionado, um futuro óbvio seria termos grande parte das ferrovias eletrificadas e assim naturalmente esta imaginária máquina deveria também ser equipada com um pantógrafo e todo o aparato técnico para funcionar como uma locomotiva elétrica comum, além do que, a energia colhida poderia ser usada também para ajudar no aquecimento da caldeira e ainda recarregar os acumuladores caso isto fosse necessário.
Quanto à parte elétrica, estamos bem servidos com alternadores síncrono trifásicos mas obviamente este que equipará esta locomotiva teria melhorias construtivas na qual seu fator de potência e grau de rendimento possam ficar acima de 0,97 (o valor ideal é 1, mas é impossível pois isto só seria obtido com 0% de perdas). Imaginemos até um alternador sixfásico, com seis fases formado por dois conjuntos trifásicos completos, permitindo mais densidade de corrente, conseqüentemente mais tração.
Falando em tração, seus motores elétricos de indução trifásicos assim como o alternador, poderiam ser mantidos com a inclusão de melhorias técnicas visando a contenção de perdas, pois este motor pode trabalhar sem problemas com potências entre 1.500 e 2.000hp contínuos. Mas não podemos deixar de pensar em outros tipos de motores. Entre eles o síncrono trifásico.
Um motor CA síncrono trifásico é construtivamente parecido com um motor de indução, sendo que seu estator é o mesmo. Sua diferença encontra-se no rotor que é um eletroímã alimentado com corrente contínua através de
uma excitatriz, exatamente como no alternador. Embora seja mais complexo e caro, pode ser construído bem mais potente que o de indução dado o mesmo tamanho, peso e corrente de alimentação, sendo portanto viável para a aplicação férrea em que se busca máquinas de altíssimo poder. Caso da nossa "máquina dos sonhos".
O vapor é uma fonte poderozíssima de energia e pode ser facilmente conseguido. Basta aquecer água a apenas 100º. Assim sendo, não é difícil construir dispositivos que possam gerar grandes quantidades de vapor a um custo baixíssimo. Algo que esta imaginária máquina poderá fazer com maestria, atingindo um ponto em que a tecnologia para tal possa ser tão comum e barata que acarrete em uma completa reversão para fonte energética completamente baseada no vapor. Reversão como a prevista na teoria de que o universo e tudo nele é pulsante, volta sempre para seu ponto inicial, ponto zero. A famosa singularidade na qual não podemos fazer nada contra, pois isto seria lutar contra as leis do universo. Leis que exterminam os primitivos em prol da evolução como a extinção dos dinossauros. Afinal de contas, os únicos monstros que pisaram sobre a terra, somos nós. E como tal, seremos os próximos.

Nenhum comentário: